Avaliação da temporada
(não é uma média)
- Há spoilers.
O segundo ano de Gen V teve que lidar com a trágica morte Chance Perdomo, que viveu Andre Anderson na primeira temporada, partindo da decisão de não escalar um novo ator para viver o personagem e a estratégia deu muito certo, pois não só Andre não foi esquecido ao longo dos oito episódios, como ele ganhou status de herói e seu sacrifício foi efetivamente utilizado como gatilho narrativo para algumas situações, especialmente o sentimento de culpa de Marie Moreau por ter fugido da prisão da Vought sem voltar para ajudar os que ficaram. O foco da série em si, ou seja, Marie ser uma super de categoria especial de poderes, nada menos do que a mesma de Homelander, como fruto de experiências secretas, poderia ser básico demais, na linha do personagem messiânico que salvará todo mundo, algo usado por vezes demais por aí.
No entanto, esse foco da série também funcionou muito bem, mas não exatamente pelo potencial messianismo de Marie, mas sim em razão da introdução de Cipher que, para mim, é facilmente não só o melhor vilão da franquia The Boys, como compete para ser um dos melhores vilões de obras super-heroicas em geral, incluindo aí séries, filmes e quadrinhos. Não só seu interesse específico por Marie levantou sobrancelhas, como todos os mistérios sobre ele foram muito, mas muito bem desenvolvidos ao longo da temporada, com Hamish Linklater vivendo o personagem de maneira irretocável. Diria até mesmo que Cipher/Thomas Godolkin foi o verdadeiro grande foco da temporada, ao ponto de sua morte ao final ter sido recebida com pesar por mim, ainda que reste aquela esperança de que ele de alguma maneira tenha conseguido transferido sua consciência para a própria Marie e acaba dando as caras indiretamente na derradeira temporada da série-mãe.
Outro aspecto que foi bem conduzido na temporada foi a manutenção dos diversos problemas psiquiátricos como parte do drama dos jovens adolescentes. A série teve muita coragem e elegância em lidar com esse assunto na primeira temporada e seria um desserviço se ele fosse esquecido aqui. Por outro lado, Sam e Cate ficaram no banco de reservas, com apenas Marie, Emma e Jordan ganhando os holofotes com constância, uma escolha que tenho dificuldades de entender. Mesmo assim, fica a torcida para que o grupo de jovens adolescentes agora bem claramente “do bem” realmente se juntem à resistência capitaneada por Luz Estrela e Trem Bala e apareçam como personagens importantes e não apenas figurantes no último ano de The Boys.
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Como fazemos em toda série ou minissérie que analisamos semanalmente, preparamos nosso tradicional ranking dos episódios para podermos debater com vocês. Qual foi seu preferido? E o que menos gostou? Mandem suas listas e comentários!
8º Lugar:
Lições de Culinária
2X06
Obviamente que o ponto alto do episódio em termos de ação e de reentrada de personagens da série principal foi a chegada da Garota Cthulhu (meu apelido carinhoso para Zoe Neuman, vivida por Olivia Morandin), que elimina Vikor (Tait Fletcher) com bastante “classe” e prenuncia a chegada de ninguém menos do que seu avô Stan Edgar (Giancarlo Esposito) que, como aparentemente todo mundo na temporada, está atrás de Marie. É a partir desse ponto, porém, que a história vai descansar um pouco lá no conveniente bunker subterrâneo do vilão-não-mais-tão-vilão-assim-que-porém-eu-não-confio-nem-um-pouco, com Sam e Emma começando um processo de reconciliação, Marie e sua irmã Annabeth (Keeya King), revelada como uma super com o poder de ver o futuro, tentando se entender e o Projeto Odessa ser, então, mais explicado. Durante o jantar que Stan Edgar prepara, aprendemos que Marie é como os mutantes de nível Ômega dos quadrinhos da Marvel Comics, ou seja, está em uma categoria de poder muito acima dos demais supers desse universo, categoria essa que só um outro personagem está: o Homelander, claro.

7º Lugar:
H É de Humano
2X03
Mas o melhor desse reinício é constatar que Gen V se recusa a abandonar as linhas narrativas dos problemas adolescentes. O trauma de Sam se faz presente, com o jovem tendo se viciado no “tratamento de esquecimento” ministrado por Cate a ponto de desesperar-se quando ela diz que não pode mais usar os poderes, da mesma forma que a vida bulímica de Emma ganha ótimo destaque, mas com a jovem demonstrando força para compreender e controlar o que sente. Há espaço até mesmo para que o poder de Marie, que funciona melhor quando ela se autoflagela, é desafiado pelo próprio Cipher. É corajoso ver uma série com o apelo de Gen V mergulhar tão de peito aberto nessa seara e, mais ainda, sabendo como navegar essas águas turbulentas.

6º Lugar:
A Justiça Nunca Esquece
2X02
O episódio 2X02, A Justiça Nunca Esquece, é um passo a frente nisso, com um retorno à normalidade completa já pela sua metade. Ainda bem que é um retorno relativo, ou seja, os esforços se limitaram a reunir o grupo mais uma vez – pelo menos a trinca principal, já que Sam vinha sendo manipulado por Cate que quase morre em confronto com Jordan em um bom momento do primeiro episódio – e a criar um novo mistério ao redor do tal projeto Odessa, mistério esse que não demora a ser revelado ou, pelo menos, a ter uma direção de resolução bem claramente indicada, já que Emma, com a ajuda de Polarity, que os está ajudando em memória ao seu filho, descobre que Marie parece ser o foco desse mistério depois que eles entram em um cofre que deixa mais do que clara a conexão nazista de Godolkin e, por via de consequência, a Vought. Essa é uma vantagem do segundo episódio e, pelo visto, da temporada como um todo, pois, mesmo com o retorno ao que era antes, parece existir uma vontade genuína de seguir adiante sem muita enrolação.

5º Lugar:
Novo Ano, Nova Faculdade
2X01
O episódio 2X01 – Novo Ano, Nova Faculdade -, no lugar de apostar no cliffhanger da primeira temporada e mergulhar em suas consequências, faz algo muito estranho, ou seja, uma elipse temporal que avança algo como um ano em que os eventos em Elmira são contados por aqueles que sobreviveram, sem nem um mísero flashback. Muito provavelmente essa escolha se deu em razão da morte de Perdomo, mas, mesmo assim, o que temos é o que o audiovisual deve sempre procurar evitar, o “fala, mas não mostra” que rouba da mídia aquilo que ela tem de mais poderoso. Mesmo com o pulo temporal, se ela era realmente inevitável, havia maneiras de se trabalhar o que aconteceu por lá sem que fosse essencial mostrar o personagem de Perdomo. Afinal, não é pouco o que aconteceu por lá. Não só há a morte de Andre, como a fuga de Marie Moreau para tentar achar sua irmã, o que compreensivelmente deixou seus amigos estupefatos. E isso sem contar com a escalação de Cate e Sam para a “causa” de Homelander e companhia, conforme vimos na quarta temporada de The Boys.

4º Lugar:
Troia
2X08
Seja como for, mesmo com o “tempo comprimido” do episódio, a estrutura do texto de Justine Ferrara e Michele Fazekas manteve-se intacta e de alta qualidade, com um Godolkin crescentemente mais insano e obsessivo em sua corrida atrás do poder absoluto, receita clássica para o fracasso. Apesar de ter adorado o “Ânus de Troia (tenho certeza que Homero teria aplaudido!), fiquei um tanto quanto cabreiro com as sucessivas reviravoltas da categoria do óbvio ululante telegrafado, como a entrada triunfal de Marie Moreau na arena depois de uma ajuda de Cate devidamente curada, seguida de seus amigos sendo defecados, o controle de Marie por Godolkin e, por último Polarity tendo também sua entrada triunfal. E, vale notar, esse problema só existe porque a direção de Steve Boyum, obviamente por ordem (ou seria controle mental?) de Eric Kripke e companhia, teve que fazer em minutos o que, em um mundo ideal, deveria ter sido bem mais espaçado. Vou parecer um disco quebrado, mas o controle de diversos supers ao mesmo tempo também teria se beneficiado demais de calma e paciência nas demonstrações do poder crescente do vilão, pois tudo o que vemos é ele fazer como um supercarro e acelerar de 0 a 100 km/h em menos de três segundos, sem que o espectador seja brindado com as etapas que levam de um ponto ao outro.

3º Lugar:
Bolsas
2X04
É, meus caros. Gen V não é para os fracos, pois, assim como South Park e outras séries nessa mesma toada, a realidade ao nosso redor tem se tornado tão enlouquecida, tão fora de esquadro que sátiras perdem a força por não conseguirem mais serem versões absurdas e exageradas do que acontece de verdade no cotidiano. Como eu mencionei na crítica anterior, chega a ser assustador Eric Kripke ter sacrificado a arte para deixar claro aos que não querem enxergar a natureza das críticas que The Boys vinha fazendo desde o primeiro segundo do primeiro episódio da primeira temporada. Mas, diferente do que aconteceu com a quarta temporada da série mãe, em que isso se tornou um problema, Gen V chega à metade de seu segundo ano ainda em ótima forma, sabendo equilibrar seus comentários críticos, mas sem atenuá-los. Afinal, em Bolsas tivemos Elon Musk – o bode Elon Musk, eu sei – sendo explodido durante o treinamento de Marie, o que não tem nada de discreto, mas, vamos combinar, tem tudo de hilário.

2º Lugar:
As Crianças Não Estão Nada Bem
2X05
Mesmo que Marie seja a grande razão de ser para a presença de Cipher na Universidade Godolkin e, sendo sincero, para toda a temporada, e que a importância de seus poderes ainda esteja envolta em mistérios, tenho para mim que é o próprio Cipher a melhor coisa da temporada até agora. Não só Hamish Linklater vem compondo um personagem intrigante, como tudo o que gravita ao seu redor tem uma aura envolta em sombras que vem funcionando muito bem para impulsionar a história, com a doentia transa dele com Mana Sábia (Susan Heyward) diante do corpo queimado do “pai” só pontuando essa afirmação. De um lado tem o projeto que resultou no nascimento de Marie, claro, mas, do outro, tem o suposto pai de Cipher na câmara hiperbárica e a natureza de seus poderes que, pelo visto, não resultam de Composto V. Pode ser até um “truque sujo” da produção inventar esse messianismo de Marie, mas eu diria que esse é o coração da série derivada e que Cipher é como o fio guia. A única coisa que eu espero é que a resolução desse mistério tenha impacto em The Boys, com Marie eventualmente tendo participação efetiva na série principal, potencialmente ajudando na derrocada do vilão, algo que parece ser justamente o que a alternância de séries promete.

1º Lugar:
Semana Infernal
2X07
E não poderia haver um clímax melhor para o arco narrativo de Cipher. Sim, pelo menos três leitores aqui do site já haviam deduzido que a pessoa que achávamos que era Cipher nada mais era do que uma inocente marionete do Thomas Godolkin desfigurado que vive em uma câmera hiperbárica, mas, sem desmerecê-los, tenho certeza de que essa conexão foi feita também por metade da internet (não tenho provas, claro, pois eu passo longe de redes sociais e de teorias sobre o que assisto), só que essa sequer é a razão pela qual Semana Infernal é um baita episódio que prepara o fim da temporada. A razão está em toda a construção lógica que, em retrospecto, percebemos que foi feita cuidadosamente pelos roteiros e que chega ao encaixe final pelo texto escrito por Thomas Schnauz, que também dirigiu o episódio. A cadência lógica é invejável. Doug Brightbill, controlado por Cipher/Godolkin, assume a reitoria da faculdade, atrai Marie de volta, treina Marie para ela desenvolver seus poderes mais do que especiais não exatamente porque ela é uma espécie de messias, mas sim porque ela é a única que pode curar o grande vilão que quer dizimar a comunidade de supers, expurgando aqueles que têm poderes inúteis, algo que a lenta manipulação feita ao longo de todos os episódio leva a cabo aqui.

