Nos últimos anos, o cineasta Guy Ritchie tem tentado se distanciar ou pelo menos expandir para fora do universo do submundo do crime que o tornou famoso em obras como Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes e Snatch: Porcos e Diamantes. Aprecio a ousadia do diretor, que entre sucessos de bilheteria como Aladdin (2019) e bombas como Guerra Sem Regras, tem se mantido consistente em ser inconsistente em termos de qualidade. Confesso que prefiro o diretor em seu elemento natural, como no recente Magnatas do Crime, mas sempre pego para assistir qualquer obra nova com certa expectativa de um bom entretenimento em sua abordagem estilizada e exagerada. A empreitada da vez é A Fonte da Juventude (2025), um filme de aventura que segue todos os clichês batidos do gênero, se inspirando em clássicos da franquia Indiana Jones e não tão clássicos filmes como A Lenda do Tesouro Perdido para entregar um enlatado no mundo dos streamings que será esquecido tão rápido quanto entrou no catálogo da Apple TV+.
Como o título não deixa enganar, a narrativa acompanha a busca pela fonte da juventude. O arqueólogo Luke (John Krasinski) e sua irmã Charlotte (Natalie Portman) embarcam em uma jornada para encontrar o mito, sendo financiados pelo ganancioso Owen Carver (Domhnall Gleeson), um bilionário que está morrendo e precisa desesperadamente encontrar a fonte. Durante a aventura, a dupla e sua equipe composta por Patrick Murphy (Laz Alonso) e Deb McCall (Carmen Ejogo) topam com a Interpol, chefiada aqui pelo Inspetor Jamal Abbas (Arian Moayed), e uma sociedade secreta que protege a fonte, enviando a sagaz Esme (Eiza González) para antagonizar os protagonistas. O roteiro básico de James Vanderbilt não engana ninguém com novas ideias ou subterfúgios, mapeando uma aventura previsível que traz uma sensação de déjà vu para os encaminhamentos típicos desse tipo de história.
Temos o jogo de gato e rato entre os protagonistas e os diferentes grupos que os perseguem; temos as camadas fantasiosas por trás dos elementos históricos e dos diversos puzzles; temos uma trama global que passa por vários países, cenários exóticos e civilizações antigas (com bom nível do design de produção, que consegue ter imersão e transpassar escopo visualmente); e, claro, temos um protagonista cômico que sabe de tudo e escapa de tudo sempre com um sorriso de canto. O fato de já termos visto esses elementos antes não invalida a produção, que poderia ser um longa genérico que se inspira em obras mais inspiradas para oferecer uma experiência razoavelmente bacana. O problema está mesmo na falta de criatividade e de imaginação de uma trama cansada, verborrágica e com poucos destaques mesmo para um entretenimento superficial e ligeiro.
Em determinado momento da fita, o personagem de Krasinski diz algo na linha de “o que importa é a jornada, não o destino“, uma frase que ele repete pelo menos dez vezes ao longo da narrativa. Essa bobagem disfarçada de autoconsciência permeia o roteiro esquemático de Vanderbilt, que é sempre expositivo demais, sempre didático além da conta para contar sua história. Os diálogos são demasiadamente artificiais, como se todo mundo fosse irônico ou então como se soubessem que estão num filme de aventura, mas sem nenhuma diversão nessa suposta metalinguagem (muito mais preguiça do texto do que algo bem pensado). Cada quebra-cabeça é um teste de paciência da audiência, com explicações desenhadas ou então conveniências ruins, sem interesse algum em construir cenas de fato envolventes na resolução de puzzles visuais. Os personagens são arquétipos, claro, mas pouco carismáticos, com Krasinski mal escalado (ele é divertido, mas não tem charme e não carrega a presença necessária para histórias dessa ordem), González interpretando uma mulher badass forçada e Gleeson incorporando o vilão maniqueísta padrão e sem graça numa reviravolta com tom de lição moral que obras sobre a fonte da juventude já representaram um milhão de vezes.
Mas a pior de todas é a personagem da Natalie Portman, junto do seu filho. A participação dos dois na trama é completamente descartável, sendo que o conceito parece querer trazer algum diferencial para esse tipo de narrativa com uma dinâmica de irmãos e co-protagonistas, mas que definitivamente não funciona, com a presença de Portman soando como uma barriga do texto pouco funcional de Vanderbilt. Tudo que os dois fazem é inchar uma narrativa que poderia ser objetiva e trabalhar a contento Luke e seus comparsas. À medida que a jornada avança, há menos interesse nos personagens (nem vale citar a equipe de coadjuvantes, que são praticamente figurantes) e menos ainda no mote até a fonte da juventude. Penso que estou me fazendo ser entendido, porque o problema em si não é o uso de clichês e sim a completa falta de vontade em torná-los divertidos de assistir.
A direção de Ritchie maquia um pouco o roteiro. O cineasta tem alguns ângulos interessantes, tem experiência em produções desse porte, sabe imitar Steven Spielberg com uma ação cômica que usa os cenários e tem blocos que entretêm até certo ponto, mas nada que efetivamente chame a nossa atenção. O terço final da obra é particularmente chato, com recortes em espaços fechados que limitam Ritchie e revelam a narrativa protocolar. Chamar A Fonte da Juventude (2025) de uma produção derivativa é uma crítica barata e fácil, mas não tem para onde fugir. O filme é exatamente isso, mas com o agravante de ter pouquíssima criatividade no uso de elementos batidos. É uma pena, porque mesmo com um conceito genérico, o grupo de artistas, tanto na frente quanto por trás das câmeras, é de respeito. A impressão que fica é que todo mundo queria um cheque gordo e a Apple TV+ estava disposta em investir para ter um filme esquecível que chamará atenção no catálogo. Só duvido muito que alguém se lembrará disso aqui no próximo mês…
A Fonte da Juventude (Fountain of Youth) | EUA, 22 de maio de 2025
Direção: Guy Ritchie
Roteiro: James Vanderbilt
Elenco: John Krasinski, Natalie Portman, Eiza González, Domhnall Gleeson, Arian Moayed, Laz Alonso, Carmen Ejogo, Stanley Tucci
Duração: 125 min.