Home FilmesCríticasCatálogos Crítica | A Valsa do Imperador

Crítica | A Valsa do Imperador

por Luiz Santiago
516 views

A Valsa do Imperador é um caso interessante de fuga de uma artista diante de uma realidade tremendamente massacrante ao seu redor. Em 1945, após terminar Farrapo Humano, Billy Wilder foi à Europa a fim de colher material para um filme sobre as Forças Armadas americanas no enfrentamento contra os nazistas. A obra deveria ter algo mais pessoal, focando nos problemas cotidianos que esses militares enfrentavam. Suas visitas aos campos de concentração, no entanto, o desestabilizou. Dessa visita, temos como produto o curta-metragem Die Todesmühlen (Death Mills), que Wilder assinou com Hans Burger e que parece ter sido o primeiro documentário a mostrar o que os Aliados descobriram quando libertaram os campos de extermínio nazistas: os sobreviventes, as condições e as evidências do holocausto. Ao voltar para os Estados Unidos, Wilder só queria uma coisa: trabalhar em um filme-fuga.

Anos mais tarde, o diretor disse que queria fazer aqui uma homenagem a Ernst Lubitsch (de quem sempre foi profundo admirador), nas idas e vindas românticas do casal principal, vivido por Bing Crosby — com quem Wilder teve muitos problemas durante a produção — e Joan Fontaine, mas que infelizmente não foi bem-sucedido. E sim, olhando para o que temos no filme, percebemos o flerte com o estilo de Lubitsch tratar a paixão e o amor, mas a execução não alcança a elegância daquele diretor e nem mesmo faz jus ao próprio Wilder. Ainda segundo o cineasta, este era para ser apenas um filme que reunisse suas memórias de infância, regadas a “profiteroles, valsas e chapéu tirolês“. O fato é que A Valsa do Imperador é um filme leve, escapista, marcado por momentos adoráveis de uma guerra de sexos aliada a uma guerra de classes, egos e diferentes formas de lidar com as paixões pessoais.

Esta é a história de Virgil Smith (Crosby), um caixeiro viajante que está na Áustria e tem por objetivo vender um gramofone para o Imperador Francisco José I, o que poderia lhe abrir o mercado no país. Em Viena, ele se encontra com a Duquesa Johanna (Fontaine), que está feliz porque sua cadela poodle acabou de ser escolhida para acasalar-se com o poodle de Sua Majestade. É aí que a figura do fox terrier de Virgil também entra em cena e a paixão entre o plebeu, vendedor americano para com a Duquesa milionária passa também a ser vista a partir de uma versão animal, o que dá à obra um caráter metafórico e fabular, inclusive porque o texto desenvolve abertamente uma crítica à valorização exacerbada da divisão de classes e classificação de humanos ou qualquer outro ser vivo como “melhor” ou “pior” que o outro; “digno” ou “indigno” de vida em relação ao outro.

O entrelaçamento entre as cenas de musical e a outra parte do filme é um problema aqui. Esses números parecem perdidos no meio da narrativa e um deles, o dos violinos e outros instrumentos na pequena cidade nas montanhas, é um encaixe que atrapalha o andamento de coisas mais interessantes, como o próprio relacionamento dos protagonistas, sempre em esplendorosos figurinos.

Nesse aspecto, o texto divide a atenção entre as estripulias caninas e as diferenças de vida e pensamento entre Virgil e Johanna, contraste que de imediato traz boa dose cômica para a fita, mas como não é renovado — e ainda tem a dificuldade de ser uma construção em flashback — acaba perdendo a graça no meio do caminho, sobrando apenas algumas migalhas vindas do romance meio sem graça entre os humanos e a relação fofinha entre a poodle e o fox terrier, abordagem que tem mais a cara fantasiosa do filme, reforçada por sua fotografia e direção de arte que flertam com o teatro. Não é uma comédia refinada de Billy Wilder mas consegue garantir o charme escapista pretendido pelo diretor, com uma fuga para um “tempo perdido nos sonhos“. Um conto de fadas incomum.

A Valsa do Imperador (The Emperor Waltz) — EUA, 1948
Direção: Billy Wilder
Roteiro: Charles Brackett, Billy Wilder
Elenco: Bing Crosby, Joan Fontaine, Roland Culver, Lucile Watson, Richard Haydn, Harold Vermilyea, Sig Ruman, Julia Dean, Bert Prival, Alma Macrorie, Roberta Jonay, John Goldsworthy
Duração: 106 min.

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais