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Crítica | Arqueiro Verde: Renascimento

por Luiz Santiago
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O caminho até aqui:

Quando você vive em um mundo onde existe uma coisa tenebrosa chamada Arrow, qualquer novidade relacionada ao protagonista da série é capaz de colocar para brigar dois sentimentos bem diferentes: o temor de que este novo produto possa ser mais um lixo tóxico e, por outro lado, a vontade de que seja uma coisa boa, afinal, o malfadado Oliver Queen é um grande personagem e merece uma boa jornada, especialmente nos quadrinhos. Pois bem, aqui, venceu o segundo sentimento. Green Arrow: Rebirth é uma excelente edição e uma das melhores portas de entrada para este novo Universo DC.

Assim como também observado em Batman: Renascimento, a linha central da história traz um pé no gênero horror e mistura essas sombras da cidade com uma grande dose de otimismo, gerando conflito entre o mundo mais otimista dos heróis versus o tenebroso mundo onde eles vivem. Escrito por Benjamin Percy, que em um primeiro momento foi mal recebido pela comunidade nerd ao ser anunciado para o título, dado o trabalho não tão interessante que ele assinou para o Arqueiro nos Novos 52, o roteiro deste one-shot é a melhor coisa de Rebirth até agora, não só por fazer muito bem a recolocação do “velho Oliver Queen” nos quadrinhos ou por trazer de volta o seu relacionamento com Dinah Lance — esquecido na fase anterior –, mas também por nos apresentar um herói com elementos clássicos, especialmente em sua constituição moral, em um mundo pós-moderno. O contraste de posturas e toda a briga ideológica daí derivadas são simplesmente deliciosas de se acompanhar.

A primeira coisa que nós percebemos nesse roteiro é a objetividade ao tratar o cotidiano de Oliver Queen e problematizar sua vida pessoal, tendo como base frases de efeito ditas por ele e motivos éticos para fazer o que ele faz. Quando a Canário Negro entra em cena, ela serve como porta-voz do leitor e das mencionadas Liga da Justiça e Batfamília, mostrando que todos, em um momento ou outro, já ficaram bravos com Oliver por conta de sua luta incisiva para que a justiça fosse feita, especialmente em favor daqueles, por muito tempo, esquecidos pela justiça.

Momento fofura + momento de ouvir verdades.

Do contraste vindo do “homem cafajeste” no início para o “benfeitor e defensor dos pobres” mais adiante, vemos que o herói está atento e preocupado com os problemas sociais à sua volta e que tem consciência de sua posição aparentemente contraditória em relação àquilo que defende. Novamente, Dinah serve como um núcleo de críticas ao “ricaço e esnobe” que fala sobre justiça social, um tipo “esquerda caviar”, para utilizar o vocabulário conhecido aqui no Brasil para indivíduos de posição política à esquerda mas que estão em uma classe social considerada privilegiada… É óbvio que essa abordagem na HQ irritou a muitos leitores, que se esqueceram de valorizar e entender a parte boa dessa dinâmica tratada no universo de um super-herói, especialmente do Arqueiro Verde. Já andam por aí falando de um “esquerdismo”. Pois é… era só o que faltava.

Em um roteiro que envolve desaparecimento de mulheres e crianças pobres (muitas delas, sem-teto), é de se esperar que as coisas avancem pela cidade, valorizando o caráter urbano desse conceito e dando a oportunidade dos heróis em questão mostrarem ainda mais suas habilidades em um amplo espaço. Neste ponto, a arte de Otto Schmidt e as cores de Nate Piekos coroam a edição com o bloco do mar de lama dos subúrbios, saindo do super-apartamento de Ollie e avançando para uma escura região de mata onde pessoas vivem em barracos ou cabanas improvisadas e são caçadas pelos Homens Subterrâneos (Underground Men) a fim de serem vendias em um leilão para servirem de “escravos, prazeres ou experiências“.

Percebam que Benjamin Percy não dá trégua no trabalho com problemas encontrados em qualquer grande cidade. Claro que aqui existe o necessário “exagero da realidade”, pois estamos falando de uma história em quadrinhos, mas temas como miséria e tráfico humano são encontrados em nosso mundo e, vê-los mostrados aqui, desta forma, já nos dá uma noção de que uma abordagem humanista e uma forte tendência realista (onde se adicionará o horror) farão parte desta primeira fase do Arqueiro em Rebirth.

Os desenhos de Schmidt seguem uma aparência diferente ao longo da edição, de um traço mais suave no início (colorido com igual suavidade por Piekos) para composições que lembram um pouco desenhos sobre aquarela, encontrados nas cenas em seu apartamento ou nos quadros noturnos, seja na mata onde estão os mendigos, seja no leilão subterrâneo, feito nos escombros da antiga Seattle, onde vemos tons de azul e verde dominarem os quadros e tornarem tudo ainda mais medonho.

Com piadas sobre a barba grande, breve passada teórica pelos dissabores de Ollie da ilha, forte subtexto político-social e boa dinâmica com a Canário Negro (cuja representação artística do grito ficou excelente, diga-se de passagem), Arqueiro Verde: Renascimento traz um enredo bem diferente do que a maioria de nós esperávamos, tendo como vilões um grupo de indivíduos que traficam pessoas, todos eles usando máscaras — dentre as quais é possível ver uma de um membro da Corte das Corujas e outra que parece um Doritos de carne moída crua — e um grupo de Homens Subterrâneos que parecem ser resultado de estranhas experiências científicas. É impossível não ficar ansioso para o desenrolar da série a partir daqui.

Arqueiro Verde: Renascimento (Green Arrow: Rebirth) — EUA, 1º de junho de 2016
Roteiro: Benjamin Percy
Arte: Otto Schmidt
Cores: Otto Schmidt
Letras: Nate Piekos
Capa: Juan Ferreyra
24 páginas

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