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Crítica | Cowboy Bebop: O Filme

O longa-metragem do cowboy do espaço!

por Kevin Rick
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Spike está cansado de comer miojo. A única saída então é embarcar na caçada ao terrorista Vincent Volaju, que recebeu uma recompensa de 300 milhões após ter soltado um vírus mortal que matou e lesionou vários civis. Salvando o mundo para conseguir um prato de comida? Bem típico da lógica Cowboy Bebop. Situado em Marte no ano de 2071, 49 anos depois da Terra ter sido quase totalmente abandonada após uma catástrofe, e acompanhando os caçadores de recompensas da espaçonave Bebop, o longa-metragem de 2001 se passa entre os episódios 22 e 23 da série original. Dirigido por Shinichirō Watanabe e escrito por Keiko Nobumoto (mesma equipe criativa do anime), o filme é uma espécie de episódio estendido.

A narrativa abre com um caráter melancólico ao vermos Spike deitado, seguido de uma sequência que mistura suspense policial e noir (principal tom da obra) com um plano do chão seguindo o protagonista pelas ruas criminosas como um detetive cínico e combatente urbano – aliás, a trama do longa é, talvez, a mais investigativa da franquia. Pouco tempo depois, vemos o ataque terrorista que desencadeia todos os eventos da narrativa, levando a trupe do Bebop para uma história mais sóbria e tematicamente densa (mesmo para os parâmetros do anime), incluindo bioterrorismo, conspiração militar e anarquismo; tudo envelopado por um thriller tecnológico com camadas de solidão.

No entanto, mesmo focando no clima taciturno, o longa, assim como o show, tem como lei artística a pluralidade. A obra traz a corrente da ficção científica com o teor tecnológico e com as estéticas fantásticas dos ambientes distópicos e das naves, provavelmente com a melhor animação da franquia – que já era fantástica (!). Algumas perseguições no ar são de tirar o fôlego, principalmente no clímax que a direção adota um estilo mais épico e de grande escala para uma trama em larga parte introspectiva e intimista, como é da característica urbana da série. Além disso, os combates mão-a-mão são um show à parte, provendo um espetáculo de ação fluída com a coreografia de artes marciais. Tudo isso é pontuado pela pegada conceitual do western, incluindo vários duelos armados e algumas referências ao gênero, além do divertido alívio cômico na interação do grupo.

E como falar de Cowboy Bebop sem tocar na trilha sonora? A compositora Yoko Kanno arrasa novamente. Mesmo reciclando algumas melodias e construções de ambiente da série, a artista consegue injetar personalidade e familiaridade com um cuidado musical primoroso para cada cena. Os combates são sempre acompanhados de um jazz frenético que eleva o estilo de cada soco e chute, enquanto os vários momentos de melancolia são acompanhados por temas musicais orquestrais delicados. Importante notar como a compositora é eclética em distinguir personalidades dos personagens com a trilha. O texto entrega várias aventuras solos à trupe, e Yoko oferece um tom country para o cowboy do espaço, assim como uma melodia pueril e quase Bossa-nova para um divertido bloco de Ed. Se não fosse o bastante, a compositora incorpora elementos temáticos árabes em uma viagem investigativa de Spike a uma cidade que mimetiza o Oriente Médio.

Em suma, em termos técnicos, visuais e diversidade de gêneros, o longa-metragem está em par com a série, e até diria melhor em vários aspectos da animação, pois o maior orçamento é utilizado para imprimir uma estética próxima de live-actions e blockbusters. Onde o longa peca para mim é no enredo. A história e as motivações do vilão principal são pra lá de confusas, além de que o texto parece querer dar um nível de profundidade melancólica a um antagonista que é extremamente genérico e desinteressante, bem mais próximo de uma trama de melodrama do que a contemplação absurda de Spike.

Esse lado fraco do enredo, que nunca parece realmente sólido e complexo como aparenta, prejudica o ritmo e o desenvolvimento do thriller tecnológico, deixando o filme mais monótono do que aventureiro. Como eu disse no início da crítica, o longa preza mais pelo noir do que a ação, e esse desequilíbrio ligado a uma trama meio rasa deixa a experiência mais (levemente) chatinha que de costume no universo. O fato de que pouco vemos de Jet, Ed e Faye, também machuca a dinâmica do longa, além de que a obra dificilmente funciona para um espectador em primeira viagem, já que a identificação prévia que temos com a trupe é um fator de extrema importância para as interações e a comédia fluírem.

É bastante claro como Watanabe e Nobumoto sofrem para criar uma narrativa mais encorpada dentro de uma minutagem maior que exige mais substância do que a estrutura solta e descompromissada do anime. Ainda assim, mesmo com problemas, é difícil não adorar a criatividade singular de Cowboy Bebop. O filme navega entre tons e gêneros com uma facilidade absurda, criando atmosferas diversas, do trágico ao ingênuo, e experiências visuais maravilhosas, desde a ação explosiva ao noir intimista. E, claro, sempre acompanhado da trilha sonora que é basicamente um personagem à parte. Assistir o melancólico e cômico cowboy do espaço salvando o mundo para conseguir um prato de comida continua divertido como sempre!

Cowboy Bebop: O Filme ( カウボーイビバップ 天国の扉, Kaubōi Bibappu: Tengoku no Tobira) – Japão, 2001
Direção: Shinichirō Watanabe
Roteiro: Keiko Nobumoto
Elenco: Kōichi Yamadera, Megumi Hayashibara, Unshō Ishizuka, Aoi Tada, Ai Kobayashi, Tsutomu Isobe, Renji Ishibashi, Mickey Curtis
Duração: 115 min.

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