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Crítica | Doctor Who – 10X01: The Pilot

por Guilherme Coral
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estrelas 5,0

Atenção: contém spoilers.

O período de tempo entre Hell Bent e a décima temporada de Doctor Who foi especialmente complicado para os fãs. Para começar, o seriado entrou em um hiato de um ano, contando, nesse espaço, com apenas dois episódios especiais de Natal. Além disso, claro, foram anunciadas as saídas tanto de Steven Moffat, atual showrunner, quanto de Peter Capaldi, o que pode e deve significar uma completa repaginação da série, similarmente ao que tivemos na quinta temporada. Curiosamente, The Pilot também funciona como um novo começo, uma re-introdução que chega a explicar o tempo que ficamos sem uma nova temporada.

É bastante claro, desde os segundos iniciais, que o objetivo do roteiro de Steven Moffat é apresentar a nova companion, Bill (Pearl Mackie) e, consequentemente, o próprio Doutor (Peter Capaldi), já que ela própria precisa descobrir quem ele é de verdade. A garota, que trabalha na cantina da uma universidade, estivera frequentando as aulas dessa figura misteriosa, até que ele a chama para sua sala e decide se tornar seu tutor particular, mesmo ela não sendo, tecnicamente, uma aluna da instituição. Paralelamente, um misterioso ser, que toma a forma da paixão de Bill, Heather (Stephanie Hyam), começa a perseguir a jovem.

Se Doctor Who pode ser definido em uma palavra, então essa seria renovação – a série constantemente passa por novos começos a fim de se regenerar, trocando o ator que vive o protagonista e todo o elenco ao seu redor. Isso está claramente presente aqui em The Pilot, cujo título não é esse por mero acaso, funcionando, sim, como uma espécie de piloto para a série, mesmo estando em sua décima temporada. Moffat cria um roteiro até bastante didático, introduzindo os diversos elementos da mitologia do seriado pouco a pouco, chegando até a explicar o porquê do nome de sua nave ser Tardis e ela ter a aparência de uma cabine policial azul.

Isso não quer dizer, contudo, que o roteiro fora preparado exclusivamente para os novatos, que nunca sequer um episódio da série assistiram. Através de uma narrativa dinâmica, o capítulo consegue envolver tanto as novas audiências quanto as veteranas, não poupando a utilização de elementos emblemáticos desses mais de cinquenta anos de Doctor Who. Retratos de Susan, a primeira companion e neta do Doutor e River Song, sua esposa, são encontrados em sua mesa, assim como outros objetos que, por si só, funcionam como um profundo respeito à toda jornada do protagonista ao longo dessas décadas.

Mas The Pilot vai muito além do texto, com direção e montagem que nos passam tantas ideias quanto as palavras ditas em tela. Desde os primeiros planos, o diretor Lawrence Gough brinca com a simetria em seus enquadramentos, algo que a direção de arte também faz através dos cabelos e figurinos. A construção das imagens dialoga diretamente, portanto, com os conceitos trabalhados no episódio e não somente através de sua substância, como por meio da própria forma. A montagem, ainda, vai além, encadeando, de maneira ágil, sequências temporalmente distantes sem utilizar didáticas elipses – cria-se um paralelo com a aula do Doutor, a respeito do tempo, no início do capítulo. Tudo parece estar acontecendo sequencialmente, imediatamente, quando, na realidade, são quadros estáticos à parte um do outro.

A narrativa continua com seu subtexto paralelo à trama principal quando percebemos que há algo de errado, ou diferente, com o Doutor. Assim como Bill deve enxergar que há algo de estranho em seu reflexo na poça, nós devemos ver o que se passa com o Senhor do Tempo. Está claro, principalmente tendo acompanhando a nova temporada, que ele está traumatizado. Um breve diálogo nos dá a entender que anos se passaram, afinal, ele está dando aulas na universidade há cinquenta, talvez setenta anos. Além disso, há um cofre secreto debaixo da instituição e ele parou de viajar, algo deixado bem claro pelo sinal de “fora de serviço” na porta da Tardis. Cabe, portanto, a nós, espectadores, desvendarmos o mistério por trás disso tudo.

Tais questionamentos somente aumentam através de alguns singelos detalhes do episódio. Primeiro, é notável como o quadro parte de Bill para Susan em um dos pontos específicos do capítulo. Será que há alguma relação entre os dois? Afinal, o Doutor notou especificamente sua presença em sua sala de aula, mas pode ser apenas algo que o fez lembrar de sua neta. Já outro ponto é o combustível inteligente que toma a forma necessária dependendo de onde estiver – funciona muito similarmente à própria Tardis, não? Considerando que veremos, aparentemente, bastante do Mestre nessa temporada, é possível que isso já estabeleça uma relação com o famoso(a) antagonista. A apresentação dos Daleks, desde cedo, para Bill também pode significar uma outra aparição das criaturas para a companion, visto que, agora, ela tem consciência da ameaça que eles representam.

Dito isso, precisamos falar sobre a companheira em si. Como sempre, a mudança da pessoa ao lado do protagonista altera completamente a dinâmica da série. Pearl Mackie nos entrega um retrato perfeito da curiosidade, ansiedade e a consequente impulsividade. Profundamente expressiva em seu olhar, a garota nos traz uma personalidade bastante distinta de Clara Oswald, que tanto tempo permaneceu no seriado e os traços de sua persona são utilizados para compor o humor característico do capítulo.Sendo negra e homossexual, ela também traz a necessária representatividade dentro do seriado, algo que é perfeitamente trabalhado no capítulo, que utiliza sua sexualidade como alavanca para movimentar a problemática central. Através de Bill temos, também, ótimos momentos de metalinguagem e referências à cultura pop, também utilizados para construir a comédia do episódio.

Doctor Who, portanto, apresenta uma cara nova nesse início de décima temporada, introduzindo uma nova companheira do Doutor e reapresentando os velhos e principais elementos que compõem o seriado. Para os novatos, esse funciona como um perfeito ponto de partida, explicando o que deve ser explicado, sem exagerar no cansativo didatismo. Já, para os veteranos da série, não há como não notar a dinâmica diferenciada, que traz um novo ar para o seriado, que, como já dito antes, é pautado na renovação. Além disso a questão sobre o que há de diferente com o Doutor é deixada, resta aguardar os próximos capítulos para desvendarmos esse mistério.

Doctor Who – 10X01: The Pilot — Reino Unido, 2017
Showrunner:
Steven Moffat
Direção: Lawrence Gough
Roteiro: Steven Moffat
Elenco: Peter Capaldi, Pearl Mackie, Matt Lucas, Nicholas Briggs, Stephanie Hyam
Duração: 49 min.

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