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Crítica | Doctor Who – 7X08: Cold War

Honra e humanidade à beira da guerra.

por Rafael Lima
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Com Doctor Who se aproximando dos 50 anos, a série aos poucos resgatou as questões da Time War e o papel do Doutor na guerra, algo que a Era Smith tratou como pano de fundo até ali. Nesse cenário, parece certo trazer os Ice Warriors de volta. Esses alienígenas marcianos, vistos pela última vez na TV em 1973, se destacavam como vilões um pouco mais complexos devido ao código de honra que guiava as suas ações, ao ponto de a Série Clássica até trazer Ice Warriors não vilanescos, mesmo de uma espécie militarizada. Ainda que não exponha os paralelos com o Doutor explicitamente, Cold War mantém esses temas no subtexto. Na trama, em 1983, um submarino nuclear russo leva uma criatura encontrada congelada para Moscou, para ser estudada. Mas no caminho, o monstro se liberta, ameaçando causar um desastre nuclear. Quando a TARDIS chega na embarcação, para a surpresa do Doutor e de Clara, que esperavam ir a Las Vegas, o Time Lord descobre que o monstro é um Ice Warrior, membro de uma raça de guerreiros alienígenas que ele enfrentou no passado, o que o põe em uma posição de não só evitar uma guerra nuclear, mas também interplanetária.

Escrito por Mark Gatiss, Cold War adota um formato familiar para o show, que é o da Base Sob Cerco, onde o Doutor deve salvar um grupo de pessoas da fúria de um monstro que ronda um ambiente fechado. É uma escolha apropriada, tendo em vista que os Ice Warriors surgiram nesse tipo de trama, e que faz sentido com o estilo de escrita de Gatiss para Doctor Who, que sempre foi referencial. O roteiro entende o que tornou os monstros assustadores nos anos 60, assim como o seu caráter ambíguo. Assim, a escolha por colocar a trama na Guerra Fria é mais do que um motivo para as homenagens que o episódio faz aos thrillers de submarino, como Caçada Ao Outubro Vermelho ou Maré Vermelha.  Reflete a ambiguidade do monstro e do próprio Doutor, tendo como pano de fundo um conflito internacional nem sempre fácil de ser posto em termos de bem e mal. Cold War tem uma dívida clara com Dalek, que segue sendo a melhor reapresentação de um vilão clássico na Nova Série, pois há semelhanças claras entre as duas histórias. Mas seria injusto com Cold War apontá-lo como só um pastiche do que veio antes. Existem acréscimos interessantes à mitologia dos personagens, vide o fato de, pela primeira vez, vermos um Ice Warrior fora de sua amadura, algo usado de forma inteligente pela narrativa.

Embora o trabalho de Matt Smith como o 11º Doutor seja lembrado por seus momentos grandiloquentes, Cold War é um exemplo de que o ator também sabia fazer o seu personagem brilhar nas sutilezas. Excetuando os momentos iniciais, em que o Doutor não consegue acreditar no azar que tem de se materializar em um submarino naufragando com um Ice Warrior, Matt Smith abandona qualquer ar mais leve que o seu personagem possa ter pra manter um ar semblante de tensão ao longo de todo o episódio, de modo que toda a ameaça representada pelo monstro é perfeitamente refletida na atuação do ator. Cold War também é o episódio em que Clara se estabelece definitivamente como Companion. Nos episódios anteriores, a garota estava fascinada demais com o Doutor e com o mundo que o cerca para realmente perceber o real peso de ser uma viajante da TARDIS. Mas nesta trama, a jovem vê as pessoas morrerem ao seu redor, e os riscos parecem muito mais reais e imediatos do que nas aventuras anteriores da moça. Desse modo, faz sentido que Jenna Coleman viva Clara de forma mais vulnerável, estando mais disposta a ouvir as orientações do Doutor, mas nem por isso deixando de demonstrar a humanidade que faz dela uma boa companheira.

A dupla principal ganha nesse episódio o apoio de um elenco de coadjuvante veteranos de peso, começando por Liam Cunningham, que concede uma força e um pragmatismo dignos de nota para o capitão do submarino soviético, não só nos fazendo torcer pelo personagem, mas tornando absolutamente coerente que ele aceite a presença do Doutor e as alegações dele de ser um alienígena viajante do tempo. David Warner também tem uma participação muito divertida como o Professor Grisenko, criando uma conexão interessante com Clara, e fornecendo a leveza para um episódio que, de outro modo, seria excessivamente sombrio.

Douglas Mackinnon entrega aqui provavelmente o seu melhor trabalho na direção do show. Tanto a decupagem quanto a fotografia constroem um ótimo tom de claustrofobia dentro daquele submarino, além do trabalho de sombras criar a sensação de que o Ice Warrior espreita em cada canto. O design de produção também merece aplausos por recriar a clássica armadura dos guerreiros marcianos com toda a aura sessentista que possuem, mas sem sacrificar a sua credibilidade como ameaça. Por fim, mas não menos importante, o trabalho de CGI na criação do Ice Warrior sem armadura é ótimo para os padrões da série de 2013, ainda incluindo boas articulações com a maquiagem prática.

Embora, em primeira instância, possa parecer um episódio sem grandes riscos e de valor puramente nostálgico pela reintrodução de um vilão clássico, Cold War revela-se um dos roteiros mais sólidos e interessantes escritos por Mark Gatiss. A maneira como a história usa tanto os Ice Warrior quanto os soviéticos para estabelecer que uma pessoa pode encontrar a bondade mesmo diante da pressão da guerra é um foreshadowing muito inteligente para o que a série fará com o próprio Doutor em breve, além de funcionar como o batismo de fogo definitivo de Clara Oswald como Companion. E se nada disso importar muito para o espectador, o episódio é uma aventura Sci-Fi empolgante, cheia de humor e suspense, que no fim das contas, é o que define alguns dos melhores episódios de Doctor Who.

Doctor Who – 7X08: Cold War – Reino Unido. 13 de Abril de 2013
Direção: Douglas Mackinnon
Roteiro: Mark Gatiss
Elenco: Matt Smith, Jenna Coleman, Liam Cunningham, David Warner, Tobias Menzies, Josh O’Connor, James Norton, Charlie Anson, Spencer Wilding, Nicholas Briggs
Duração: 41 Minutos

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