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Crítica | It: Bem-Vindos a Derry – 1X07: O Black Spot

O verdadeiro horror não tem nada de sobrenatural.

por Ritter Fan
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  • spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios e de tudo sobre It.

It: Bem-Vindos a Derry é uma série curiosa, mas não no sentido positivo. A produção não sabe muito bem o que quer ser, ensaia caminhos aqui e ali, acertadamente esconde a versão Palhaço Dançarino da criatura extradimensional apesar de todo mundo conhecê-la, mas não sabe o que fazer sem Pennywise. Tire a manifestação mais conhecida do grande vilão e o que temos é uma sucessão de equívocos audiovisuais que não oferece nada significativamente melhor do que a segunda parte da duologia de Andy Muschietti, que muito claramente serviu de base para a série e que é uma obra inferior de horror, muito mais preocupada com fogos de artifício do que com construção de atmosfera. O Black Spot, penúltimo episódio da temporada, é sem dúvida o trabalho mais competente do cineasta desde It: A Coisa e, mesmo assim, o resultado não chega nem próximo do potencial que a história tinha, ainda que eu tenha certeza absoluta, sem nem precisar passear por redes sociais, o que evito com  todas as minhas forças, de que ele será reverenciado pela gigantesca maioria das pessoas, o que é genuíno e perfeitamente válido, diga-se de passagem.

Assim como aconteceu com Em Nome do Pai, o novo capítulo começa com um flashback que desta vez nos leva para 1908, ou seja, o ano da terceira manifestação da Coisa contando de trás para frente da que a série aborda e que será objeto, até onde sei, de futura temporada. Lá, em uma feira itinerante de diversões, somos apresentados a Bob Gray, o Pennywise humano (Bill Skarsgård), e à versão de oito anos de sua filha Ingrid (Emma-Leigh Cullum), em um show bizarro que começa engraçado e inocente até enveredar por um caminho no mínimo questionável, com a menina, em seguida, debutando como Periwinkle para seu pai, e, ao final, ele sendo atraído e consumido pela Coisa que, 27 anos depois, em 1935, retornaria usando essa persona para atrair crianças mais facilmente. Não é um flashback tão eficiente quanto o do episódio anterior, mas é a oportunidade de Skarsgård aparecer de outra maneira na série, o que sem dúvida vale o esforço, com o ator mostrando sua razoável versatilidade, além de estabelecer a conexão entre pai e filha que, claro, já conhecíamos, mas que, vendo os detalhes, nos aproxima do drama e do que podemos mentalmente construir como o começo da espiral de insanidade de Ingrid.

Quando retornamos ao presente da série, começamos do exato ponto em que Em Nome do Pai acabou, com “justiceiros” invadindo o Black Spot para capturar e matar (obviamente) Hank Grogan que, ao valentemente aparecer para se entregar, inadvertidamente condena quase todos à morte. Esse é um momento muito importante do romance de Stephen King que ainda não havia sido mostrado nesse universo de Muschietti, apenas brevemente abordado na sua dupla de filmes e que o diretor lida muito bem apesar de o fogo em computação gráfica ter conseguido ficar pior do que as criaturas estranhas que deram as caras anteriormente. Confesso que não adoro a mistura do real com o sobrenatural dentro do Black Spot, com Pennywise por ali, fazendo sua festa, e Dick não só vendo, mas conversando com gente morta, mas entendo que não havia saída em termos narrativos. Minha razão para não gostar, se interessar a alguém, é que eu acho que ao trazer um palhaço que literalmente come as pessoas para uma situação em que o que mais importa é a crueldade humana e o sofrimento daqueles que mais uma vez se veem sem defesa alguma, acaba diluindo a intensidade de tudo. A maldade humana não se compara com palhaços assassinos do espaço sideral e isso poderia ter sido evitado para manter o horror com os pés fincados no chão, ainda que eu não tenha “tirado pontos” do episódio por essa razão.

A morte de Rich, telegrafada que foi já no episódio anterior, foi outro grande acerto, recriando, no fogo, aquilo que vimos na água em Titanic, com os dois atores mirins novamente convencendo nos papeis de pombinhos enamorados. A conveniência da sobrevivência de Hank Grogan foi menos interessante, mas faz sentido narrativo, já que ainda há um episódio pela frente e essa história certamente será importante. Pela primeira vez, porém, achei que o drama de Dick Hallorann perdeu seu gás, com o personagem subaproveitado, mesmo que ele tenha sido o instrumento de salvação de Hank, Will e Ronnie e que ele finalmente tenha descoberto o caminho para um pilar. Foi uma versão pálida do personagem traumatizado pela abertura da caixa mental que merecia mais destaque do que ele ficar se balançando para frente e para trás, mas ao mesmo tempo convenientemente alerta, responsivo e capaz de fazer tudo o que o Dick antes da abertura da caixa fazia. É um caminho fácil demais mudar o status quo de um personagem sem mudar nada que realmente conte.

Contrastando Dick com a versão adulta de Ingrid, que aparece do lado de fora do Black Spot em chamas como Perinwinkle, essa questão fica ainda mais evidente. Sua condição de enfermeira e amiga de Lilly era a fachada para o horror que ela ajudou a perpetrar, mas sua obsessão com o pai- aquilo havia deixado de ser amor há muito tempo – a mantinha completamente funcional até quebrar completamente quando ela finalmente percebe o óbvio que somente é óbvio para nós, espectadores, que aquele monstro na sua frente não é seu pai. Apesar do que Ingrid fez e que ela não precisava ter explicado para quem assiste séries vendo TikTok no celular, esse é um momento que pede que o espectador perceba no que ela, ao longo de décadas, acabou se tornando e o horror em seu rosto é um misto de dor, arrependimento, surpresa e pavor, com Madeleine Stowe acertando em cheio o tom de sua personagem nos poucos segundos em que ela aparece.

O que realmente me fez murchar durante a experiência foi o gigantesco dénouement – mais longo do que toda a sequência do Black Spot – em que a Força Aérea passa a subir no palco do episódio depois da obtenção da localização de um pilar por Hallorann. Entre o “achamos!”, o suspeitíssimo “fique por aqui, soldado”, a invasão da base por Leroy transtornado apontando sua arma para todo lado e a revelação do plano mestre pelo general Shaw, toda a minha reação foi de incredulidade. Nem mesmo o resultado disso, ou seja, o novo despertar da Coisa depois de começar sua hibernação e sua posição empoleirada na geladeira de Will (podiam ter arrumado uma forma melhor, pois ficou meio ridículo), valeu a bobagem gigante que é a verdadeira intenção de Shaw. Sério que ele quer resolver os conflitos internos dos EUA soltando uma criatura que se alimenta do medo? Claro que a correlação de medo com autoritarismo e ditadura é boa – não precisava ser explicada na base do bê-á-bá, mas tudo bem -, mas o plano em si é demente demais, aleatório demais, coisa de vilão caricato com um plano mirabolante que dá até vergonha de ouvir os detalhes.

Meu receio é que o capítulo final seja usado para fogos de artifício expurgatórios de todo o personagem malvado da cidade, sejam os linchadores ou as forças armadas, com a Coisa sendo forçada a retornar à sua soneca, como sabemos que acontecerá. Seria sanitizado demais, covarde demais. O mal não acaba, nem mesmo momentaneamente, e fica a torcida, portanto, para que a temporada reconheça isso e acerte de verdade pela terceira vez seguida, que é o mínimo depois de errar tanto no começo.

It: Bem-Vindos a Derry – 1X07: O Black Spot⁩ (It: Welcome to Derry – 1X07: The Black Spot – EUA, 07 de dezembro de 2025)
Desenvolvimento:
Andy Muschietti, Barbara Muschietti, Jason Fuchs (baseado em romance de Stephen King)
Showrunners:
Jason Fuchs, Brad Caleb Kane
Direção:
Andy Muschietti
Roteiro:
Jason Fuchs, Brad Caleb Kane
Elenco: 
Clara Stack, Amanda Christine, Blake Cameron James, Arian S. Cartaya, Matilda Lawler, Taylour Paige, Jovan Adepo, Chris Chalk, James Remar, Peter Outerbridge, Rudy Mancuso, Stephen Rider, Alixandra Fuchs, BJ Harrison, Kimberly Norris Guerrero, Joshua Odjick, Madeleine Stowe, Miles Ekhardt, Bill Skarsgård, Emma-Leigh Cullum
Duração:
62 min.

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