Home FilmesCríticas Crítica | Minari: Em Busca da Felicidade

Crítica | Minari: Em Busca da Felicidade

por Kevin Rick
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Eu tive uma certa dificuldade em formular minha opinião sobre Minari, um dos frontrunners para vencer o Oscar 2021 na categoria de Melhor Filme. Grande parte da minha experiência estava em torno da contemplação da fita. Tá aí uma palavra usada e reusada constantemente quando se fala de filmes como Minari. O próprio Nomadland, outro indicado ao Oscar deste ano, se enquadra nesse ato de admiração fílmica, mas no filme dirigido por Chloé Zhao, eu fui capaz de distinguir como a obra utiliza o teor contemplativo para construir algo com identidade própria, documental e introspectivo. Já a película meio autobiográfica e dirigida por Lee Isaac Chung, num primeiro momento, me pareceu genérica demais. Contudo, quanto mais eu pensava sobre a obra, mais eu percebia como Chung tem êxito na sutileza.

A narrativa acompanha uma família coreana, encabeçada pelo patriarca Jacob (Steven Yeun) e sua esposa Monica (Yeri Han), e seus dois filhos David (Alan S. Kim) e Anne (Noel Cho), que se mudam para o Arkansas para começar uma fazenda. A primeira distinção da obra está na maneira como, apesar de ser uma história sobre imigrantes asiáticos nos EUA dos anos 80, ela nunca tende a cair no melodrama, na tão vista fixação com os males do racismo expostos de um jeito lúgubre e sensacionalista atualmente. Claro que é uma temática importante, mas sinto que muitas obras contemporâneas perdem a mão na crítica social, enquanto Minari é um grande exemplo de como ser poderoso sem ser explicativo.

A maioria dos problemas culturais tratados na obra partem do campo interno, um drama familiar como personificação de toda uma cultura imigrante em busca do esperado sonho americano. Chung utiliza em grande parte a rachadura de visões entre o casal protagonista para desenvolver questões de choque cultural e preconceito, no qual há uma discussão sobre tipos de qualidade de vida. Esse debate é manuseado para trabalhar vários pensamentos opostos ao longo da fita, como financeiro x emocional, tradicional x progresso e, principalmente, as divergentes culturas em exposição. Jacob e Monica acabam sendo uma metáfora dessa luta interna de imigrantes, em grande parte em oposição, mas se conectando e entendendo um ao outro ao longo da narrativa. O isolamento da fazenda expande as interações da família, trazendo à tona as dificuldades dos imigrantes, mas, novamente, a contemplação é o grande artifício de Chung, que a usa para transpor as adversidades a partir da compreensão.

Compreensão esta que não vem de forma alguma facilmente entre a família coreana, mas o caráter contido dos personagens, os longos shots naturalistas, a belíssima trilha sonora elementar e a contemplação – sim, ela novamente – preenchem a dramaturgia com um toque de ternura. E acredito ser nisso que Minari se sobressai, pois é capaz de abordar um leque de temáticas importantes com uma sutileza, uma tristeza sadia, por assim dizer, inseridas na dinâmica familiar complicada de um pai que quer prosperar a grande custo, e de uma mãe em conflito com sua raízes, como evoluir sem perder a si mesmo e sua cultura. Pode-se dizer que existe uma falta de propulsão ou impacto na obra, mas Minari não necessita de manipulação dramática ou apelação emocional para ser ousada em seu ritmo suave sobre um drama familiar universal, e ainda conter em suas entrelinhas o embate da complexidade da mudança, tão conectado a imigrantes.

A inserção da vovó Soonja (Yuh-Jung Youn), acrescenta um papel catalisador ao cerne familiar, se tornando mais um fator complicador no submundo que a família ocupa, uma explosão do país antigo absoluto. O próprio David diz no filme: “Vovó cheira a Coréia!”, embora o que realmente o irrite é o quão pouco ela se encaixa em suas ideias sobre como uma avó deve se comportar. O coming of age de David acaba sendo a grande importância simbólica da obra em relação ao pertencimento imigrante/coreano, ressentido de sua avó, conflituoso com sua mãe dividida, e com medo de decepcionar seu pai na incessante busca do sonho americano. Em outra nota, o relacionamento de David e Soonja, além de dramático e delicado, é extremamente divertido e gostoso de assistir.

Se você considera Minari “apenas” um bom filme ou uma obra genérica, eu consigo entender, pois foi minha experiência inicial com a fita, e a vagarosidade da direção de Chung passa esse sentimento, mas ao refletir na misé-en-scene do cineasta, vejo a obra como uma mensagem poderosa sobre pertencimento cultural, conflito interno com suas raízes e as complexas mudanças de um cenário familiar exposto isoladamente e contemplativo, mas sempre expansivo e numa crescente emocional suave de pura e simples compreensão. No fim, o que mais importa é a família e suas lutas titânicas com o clima, com o destino e entre si.

Minari – EUA, 2020
Diretor: Lee Isaac Chung
Roteiro: Lee Isaac Chung
Elenco: Steven Yeun, Yeri Han, Alan S. Kim, Noel Cho, Darryl Cox, Will Patton, Yuh-Jung Youn, Jacob M Wade, Eric Starkey, Ben Hall, Esther Moon
Duração: 115 min.

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