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Crítica | Star King (Príncipes Demônios #1), de Jack Vance

Um delicioso faroeste detetivesco espacial.

por Ritter Fan
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John Holbrook Vance, prolífico autor americano de romances de mistério, fantasia e ficção científica, muito ativo nas décadas de 50, 60 e 70 do século passado, escreveu sob diversos pseudônimos, mas talvez o mais famoso deles seja mesmo Jack Vance que poderia muito bem ser o nome de um de seus vários heróis pulp em obras publicadas de maneira serializada em revistas de gênero e também diretamente como livros. Um dos escritores da época que, como é também comum hoje em dia, refestelava-se em escrever diversas obras dentro de um mesmo universo, entre 1963 e 1981, ele publicou cinco livros abordando o aventureiro espacial Kirth Gersen em sua obsessiva caçada de vingança aos cinco autointitulados “Príncipes Demônios” que, quando ele era pequeno, atacaram, escravizaram e massacram a colônia onde ele vivia, com apenas ele e seu avô sobrevivendo para contar história.

Logo no começo do primeiro romance, Vance, em narração em terceira pessoa, explica que Gersen foi treinado desde tenra idade por seu avô para ser um instrumento de vingança, sendo esse seu único propósito de vida, algo que ele próprio, agora já adulto, mas ainda jovem, levemente questiona, indagando-se o que será dele se ele por acaso conseguir alcançar seu objetivo. Em Star King, o primeiro alvo do vingador é Grendel, o Monstro, nome retirado do poema épico medieval Beowulf que foi modificado para Attel Malagate quando a obra foi publicada em formato de livro, ainda em 1964, o mesmo ano em que acabou a serialização iniciada no ano anterior. Na solitária estalagem de Smade, única construção do planeta de Smade, habitado constantemente apenas pelo próprio Smade, e que funciona como um território neutro tanto para vilões como para gente honesta no chamado Além, ou seja, território que está em processo de colonização e que, por isso, lembra muito o Oeste americano, Gersen obtém pistas sobre seu alvo vindas do explorador Lugo Teehalt que, sob vínculo empregatício com Malagate, descobrira um belíssimo e idílico planeta que ele não gostaria de ver ser explorado pelo patrão.

O que segue, daí, é uma narrativa engenhosa que coloca Gersen seguindo as pistas para achar e atrair Malagate para sua armadilhas, algo comum ao longo de todos os cinco livros da série. Também comum a eles há o fato de que, apesar de o nome dos vilões serem conhecidos e temidos pelo universo, sua aparências e nomes reais são completamente desconhecidos, o que cria as dificuldades de praxe para Gersen, que precisa agir com mais do que suas habilidades físicas para atingir seus objetivos. Com isso, o autor tem espaço para criar uma aventura espacial que faz uma bela convergência de faroestes, thrillers de mistério, romances detetivescos e, claro, a boa e velha ficção científica, com seu protagonista mostrando-se engenhoso em planos que sem dúvida parecem bem mais complicados do que precisariam ser, mas que fazem parte do charme do livro.

Mais do que uma história de vingança – pois essa linha narrativa é mantida na maior simplicidade possível – o que chama atenção em Star King para além da mistura de gênero que citei logo acima, é a capacidade que o autor tem de, aparentemente sem esforço, criar um universo variado, detalhado e fascinante que vai desde planetas citadinos altamente povoados como Alphanor, até planetas virgens como o que Teehalt descobrira. Por vezes, a pegada “fora da lei” desses planetas da fronteira lembra a que vemos em Firefly, Serenity e outros sci-fis nessa linha, por outras a abordagem de mistério, notadamente sobre a real identidade do grande vilão da vez, parece criar um emaranhado narrativo muito divertido que tira inspiração das mais variadas fontes, até mesmo Agatha Christie, já que ele usa espertas variações de whodunit para desvendar a identidade de Malagate.

Por outro lado, Vance tem menos sucesso, pelo menos neste primeiro livro sobre Kirth Gersen, no desenvolvimento de seus personagens. O próprio Gersen, monomaníaco e obsessivo, é um aventureiro de uma nota só. Sem dúvida divertido e eficiente para os propósitos da narrativa pulp que é trabalhada, mas não muito mais do que isso. Os coadjuvantes, por sua vez, parecem mais arquétipos do que efetivos personagens. Pallis Atwrode, uma assistente de uma universidade importante para a trama, é a típica “dama em perigo”, enquanto que os minions de Malagate são apenas isso, minions com nomes estranhos. Até mesmo o próprio grande vilão, por ter uma natureza secreta, existe apenas como a figura vilanesca que precisa ser derrotada ao final e mais nada.

Mas Star King é, indisfarçavelmente um sci-fi pulp e, como tal, certas concessões narrativas acabam sendo de rigueur. O que realmente importa é que Jack Vance consegue construir mundos com grande facilidade e engajar o leitor em uma irresistível aventura espacial daquelas que é impossível largar até que a última página seja finalmente virada.

Star King (The Star King – EUA, 1963/64)
Autoria: Jack Vance
Editora original: World Editions (Galaxy Science Fiction) – versão serializada; Berkley Books (livro)
Data original de publicação: dezembro de 1963 a fevereiro de 1964 (versão serializada); 1964 (livro)
Editora no Brasil: Editora Francisco Alves
Data de publicação no Brasil: 1980
Páginas: 196

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