Home TVEpisódio Crítica | The Flash – 6X09: Crisis on Infinite Earths, Parte Três

Crítica | The Flash – 6X09: Crisis on Infinite Earths, Parte Três

por Giba Hoffmann
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O homem:

A lenda:

  • Há SPOILERS deste episódio e da série. Leia aqui as críticas dos outros episódios.

Seguindo em forma o estilo adotado pelas duas partes anteriores, o terceiro capítulo da Crise nas Infinitas Terras da CW continua a zona bagunça televisiva insana, conduzindo nossos heróis de The Flash a um confronto fatídico que vem sido anunciado desde o piloto da série. Assim como ocorreu nas partes anteriores para mim, o resultado foi misto: em seus momentos bons, o episódio chega a ser efetivamente brilhante, um nível de acerto raríssimo de se ver em uma produção da emissora. Uma pena que o ruído narrativo de sempre acabe se infiltrando entre as fendas, roubando o episódio da completa glória merecida. E olha, vou dizer para você, o que não faltam aqui são fendas!

Sobre uma coisa há de se tirar o chapéu para o time de produção desse crossover: o compromisso em celebrar tanto o autêntico espírito dos quadrinhos quanto a riquíssima história televisiva do Universo DC é respeitável. Para os iludidos que pensaram ver em Vingadores: Ultimato a representação em live-action fiel de um mega crossover dos quadrinhos, a verdade nua e crua é que isso aqui, sim, nos dá as cores reais do que é um bom e velho mega-evento de gibi. Caos narrativo em toda e qualquer frente imaginável, vilões unidimensionais onipotentes, personagens teletransportando entre terras e épocas sem medida, estilo ou propósito. Pode-se criticar o que quiser do esforço, mas dizer que a renderização não é fiel aos quadrinhos seria objetivametne errado! Se isso custa em termos de coesão ou elegância narrativa, é certo que ecoa como um show de fogos de artifício que diverte e aquece o coração de quem curte essa veia da ficção. E, convenhamos, quem ligou a TV para assistir a uma renderização da Crise em plena sexta temporada de The Flash curte demais essa veia da ficção!

Vou começar pelos perrengues, para tirar eles do caminho logo de uma vez. Grande parte do que não funcionou pra mim se deve a elementos mal trabalhados anteriormente, cobrando seu preço aqui. Em continuidade relativamente fluída com as partes antecedentes, somos lançados já de cara no que, na prática, é apenas o segundo ato do drama apocalíptico, uma vez que o episódio de Supergirl fez pouco mais do que dar voltas em círculos antes de armar uma morte especialmente anti-climatica para Oliver (Stephen Amell). A gente sabe que começou o episódio de Flash porque os primeiros minutos do capítulo (após o extermínio do universo das Aves de Rapina, que o SBT hilariamente chamou de “Mulher Gato”) simplesmente nos fuzilam com diálogo expositivo. Ah, como é bom estar em casa! Brincadeiras à parte, essa é uma situação em que não tem como ser diferente: a quantidade de personagens e situações simultâneas envolvidas faz com que uma certa “licença poética” de gibi possa dar um desconto pros caras aqui.

A caçada pela alma de Oliver não me empolgou muito, em parte devido à má construção de seu sacrifício na primeira parte, em parte devido à atuação de Amell, que parece especialmente cansado dessa vida. Por sorte, a presença de Constantine (Matt Ryan) interagindo com Lúcifer (Tom Ellis) ajuda a balancear as coisas, salvando via fanservice o que poderia redundar em uma sidequest um tanto mal posicionada na sequência dos eventos em tela. Quero dizer, se todo o Multiverso está prestes a ser totalmente aniquilado, a prioridade em ressucitar essa versão pontual do Arqueiro Verde não faz lá muito sentido, faz? Um sacrifício mais significativo e um vínculo emocional melhor trabalhado com o personagem — merecido, já que foi quem “fundou” essa bagunça toda — poderiam fazer de sua alma mais do que um MacGuffin entre vários, mas não foi o efeito que teve para mim.

Quando a coisa começa a tomar mais corpo, definha no próximo movimento do roteiro: o reencontro com Diggle (David Ramsey) é breve demais, e acaba interrompido pela inesperada transformação de Oliver no Espectro. Trata-se de uma boa aposta, e do primeiro elemento realmente intrigante do núcleo de Arrow no evento, potencialmente posicionando melhor o personagem para um confronto final mais significativo. Ainda assim, essa frente acaba soando um tanto isolada do restante da coisa, presa demais aos estilismos do CW e à sombra do final da série para realmente se divertir e contribuir na tonalidade que o restante da história pedia.

O outro elo fraco é a caçada por Ryan Choi (Osric Chau), outro elemento que provavelmente tem ligação com uma futura “passada de tocha” de um de nossos heróis, que acaba tomando tempo demais com trocas nada interessantes. Em meio ao clima efetivamente épico do restante da história, a missão de recrutamento soa batida demais, apoiando-se na premissa de que o Monitor sabia que apenas Iris (Candice Patton) seria capaz de mandar um discurso tão chato que venceria o cara pelo cansaço com a celeridade necessária. Essa busca se encaixaria melhor no primeiro episódio, inclusive para dar o clima certo de introduzir um novo personagem na jogada. Contra as presenças improváveis do Raio Negro (Cress Williams) e do [tecnicamente] Superman de Christopher Reeve, além dos já citados Constatine e Lúcifer, a figura do “cientista genial cético” não empolga o suficiente e denuncia o roteirismo que, nos casos dos figurões supracitados, passa despercebido pelos nossos sentidos de fã superestimulado.

A subtrama envolvendo Kara (Melissa Benoist) e Kate (Ruby Rose) surpreende com um desenvolvimento muito bacana do conflito Batman vs. Superman retratado no episódio anterior. Examinando a clássica premissa da “kryptonita de segurança” do Morcego sob um ângulo novo, temos um desenvolvimento orgânico bem alinhado com ambas as personagens: Kara desejando utilizar-se do Livro do Destino para restaurar sua Terra, e Kate pronta a policiá-la não necessariamente por desconfiança, mas por saber que um grande poder e a boa intenção por si sós podem não garantir o melhor resultado. Os bons diálogos vendem bem esse núcleo, que escapa de ser mais um dos “cantinhos motivacionais” da produção.

Por fim, mas mais importante do que todo o restante: o momento. Sim, o momento em que o “Flash desaparece na Crise”, promessa icônica do programa semeada desde 2014 e adiantada para 2019 porque, convenhamos, não dá para contar que estaremos aqui até 2024. A premissa é genérica o suficiente para que seja possível dizer, sem exagero, que haviam inúmeras possibilidades de realizar esse lance. Por si só, o profetizado “sacrifício de Barry Allen”, em um contexto com potenciais múltiplas versões do sujeito, abre um leque de possibilidades imenso. Optando pela via de seguir com fidelidade os elementos icônicos dos quadrinhos, o enredo consegue ser eficiente em reduzir as opções consideravelmente para duas opções: nosso Velocista da Terra-1, estrela da série, e sua contraparte noventista, o Barry Allen da Terra-90 (John Wesley Shipp). Bom, adivinhem quem não estará na fantasia quando a série voltar ano que vem?

A revelação do Barry-90 como fonte de energia no coração da “rodinha de hamster antimatéria” costura bem o evento atual com Elseworlds, jogando uma nova luz sobre o teste do Monitor e o possível loophole que ele preparou para que o nosso querido Barry-1 se safasse (infelizmente não vai dar para saber se foi o caso, já que a Lyla (Audrey Marie Anderson) desceu o Shang Tsung no cara). Rodeado de expectativa e prenunciado à exaustão, o momento do sacrifício de Barry aposta na fidelidade ao quadrinho e no foco narrativo para entregar o que provavelmente é sua melhor versão possível, dadas as devidas condições.

Perfeita? Objetivamente, não. A inclusão do Raio Negro no climax poderia ter sido menos desajeitada, a transformação do Nash (Tom Cavanagh) em Pária perdeu a chance de construir melhor o personagem e, sobretudo, o lance dos velocistas na esteira poderia se beneficiar de um mínimo de fundamentação ou explicação, por mais absurda e preguiçosa que fosse. Que é que há gente, vocês são os deuses da tecnobaboseira! Duas linhazinhas de diálogo expositivo sobre alguma manobra velocista improvável evitariam a sensação de um explícito “Putz, agora parece que eu tenho que ficar ali e morrer, igual foi profetizado!” / “Não, deixa que eu vou e fico ali pra morrer no seu lugar!”.

Por outro lado, convenhamos, isso não importa tanto, e a coisa foi perfeita a seu próprio modo. Embora a produção já tenha prestado mais do que uma boa cota de acenos respeitosos à série dos anos 90 (John Wesley Shipp corresponde a uns 30% da população do Multiverso — o resto é quase todo povoado por Tom Cavanaghs), o sacrifício do Barry-90 afasta o medo de chover no molhado e consegue, com isso, garantir a melhor dessas homenagens, em um momento-chave definitivo. Seja lá o que foi que o herói veterano explicou ao nosso Barry durante sua conversa em flashtime, o que se seguiu foi o tipo de coisa que a produção sempre tenta fazer, mas dificilmente entrega com precisão: um drama heróico que, por ser simples, focado e sincero, inspira nosso coração e desliga nosso cérebro no que diz respeito à auto-indulgência da coisa toda.

Pareando uma renderização totalmente fiel aos quadrinhos com um belo e inesperado flashback direto para a série do Flash noventista, o sacrifício dessa versão do herói é ressoa paralelos interessantes tanto com os eventos da Crise original quanto o que foi mostrado nessa versão televisiva. Na Crise original, temos também o sacrifício de um Barry tecnicamente já “aposentado”, uma vez que o herói já experiente se encontrava em um período sabático no futuro. Ao mesmo tempo, acabamos de acompanhar o Clark Kent de Tom Welling vivendo uma aposentadoria pacífica e sem poderes em sua Smallville. Lado a lado, temos aqui dois “epílogos” para séries antigas que, ao mesmo tempo em que mergulham de cabeça no fanservice (com direito ao uso magistral de seus respectivos temas sonoros — só senti falta de um ♪Somebody saaaaaaaaaaaaaaaaaaave me!♪), não se resumem a uma mera pescagem de referências nostálgicas. Sem nada a perder há mais tempo e sabendo bem o que está em jogo, o sacrifício do Barry-90 fecha dramaticamente seu arco e garante que o sentimento de um Multiverso compartilhado saia mais fortalecido.

No contraste com esse sacrifício maior que evita soar gratuito ou leviano, temos um excelente momento de nosso Team Flash encarando o destino fatídico de Barry. Infelizmente a química fraca e a superexposição de Barry e Iris sabotam o momento derradeiro do casal, mas por sorte somos salvos por um momento absolutamente adorável entre o “trio original” do S.T.A.R. Labs. “Vocês estavam lá da primeira vez em que eu abri os olhos como o Flash. Eu não poderia ser o herói que eu sou sem vocês!”. É disso que eu estou falando, minha gente! Que sequência bacana, nos remetendo ao passado da série e explorando o lado sentimentalista desse completo absurdo sem excessos. Um abraço coletivo que vale por mil discursinhos motivacionais — ao invés de falar muito, mostrar o suficiente. Bonito de se ver, à altura do que o momento exigia!

Crisis on Infinite Earths, Parte Três conta, sim, com suas falhas — desde o que é herdado diretamente das premissas dos quadrinhos aos vícios próprios da produção, passando pelos problemas dos capítulos anteriores. Porém, tomado em seu contexto, ele cumpre perfeitamente a tarefa que precisava cumprir no arco narrativo mais geral da série, o que não deve ser deixado de fora em hipótese alguma. Uma ocasião única que dificilmente será equiparada pela série no futuro — é agora ou nunca que eu posso dar a nota máxima para essa versão tortuosa do Velocista! O Flash desapareceu na Crise. Vida longa ao Flash!

The Flash – 6×09: Crisis on Infinite Earths, Parte Três — EUA, 10 de dezembro de 2019
Direção: David McWhirter
Roteiro: Lauren Certo, Sterling Gates
Elenco: Grant Gustin, Candice Patton, Danielle Panabaker, Carlos Valdes, Hartley Sawyer, Tom Cavanagh, Melissa Benoist, Stephen Amell,  Katherine McNamara, Brandon Routh, Caity Lotz, Tyler Hoechlin, Elizabeth Tulloch, Ruby Rose, Matt Ryan, David Ramsey, Osric Chau, Tom Ellis, John Wesley Shipp, LaMonica Garrett, Audrey Marie Anderson, David Harewood
Duração: 43 min.

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