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Crítica | A Noite do Terror Rastejante

por Leonardo Campos
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Minhocas podem ser mortais? Na vida real provavelmente não, mas no terreno ficcional, o clássico A Noite do Terror Rastejante parece interessado em ofertar essa possibilidade aos espectadores, numa trama de horror ecológico que vai muito além do selo cinema trash e debate também temas como repressão sexual e valores familiares tradicionais, mesmo que essas linhas temáticas percam o protagonismo do centro nervoso da narrativa para a presença das famigeradas minhocas assassinas, alteradas depois de uma forte descarga elétrica ocorrida durante uma tempestade. Este é um produto de seu meio, isto é, da profícua década de 1970 e sua avalanche de filmes com animais e outras criaturas ameaçadoras, potencializadas depois do boom causado por Tubarão, adaptação do romance de Peter Benchley comandada por Steve Spielberg. Escrito e dirigido por Jeff Lieberman, a produção utiliza o tom documental de suposta veracidade dos fatos para estabelecer o clima de urgência que envolve os personagens.

O narrador alega que ao longo da noite de 29 de setembro de 1975, uma forte tempestade abateu a zona rural da costa da Georgia, o que ocasionou a queda dos cabos de alta tensão, haja vista os fortes ventos. Com isso, uma carga generosa de eletricidade foi enviada ao solo lamacento, além de deixar a população da pacata Fly Creek sem energia durante um período considerável de tempo. Diante da situação caótica, os habitantes da cidade tiveram uma das experiências mais bizarras da história da humanidade. O que? Simples: as minhocas do tal solo energizado se tornaram criaturas assassinas e formadoras de um exército asqueroso e aterrorizante. Ao desenvolver o gosto por carne humana e apetite demasiadamente exagerado, elas transformam a vida na região em um campo de batalha, com personagens em luta constante pela sobrevivência. Sensíveis a luminosidade, elas surgem a noite ou em espaços escuros para atacar, uma aparente massa gigantesca que parece uma enorme quantidade de macarrão em movimento, em cenas de humor involuntário que não se entregam ao ridículo do argumento, ao contrário, se mantém dentro da seriedade e, de fato, até debatem assuntos bem coesos.

Dentro dos arquétipos básicos do horror ecológico, A Noite do Terror Rastejante traz o xerife grosseiro, Jim (Peter Mac Lean), homem que não acredita nas afirmações do casal investigador, Geri Sanders (Patricia Pearcy) e Mick (Dan Scardino), os primeiros denunciantes sobre o aparecimento das minhocas. Juntos, eles partem numa cruzada para tentar convencer as pessoas do desastroso projeto das minhocas assassinas. Ela é uma virgem local, recatada e do lar. Ele é um jovem da cidade grande, especificamente, Nova Iorque, em passeio pela cidade. A união alegoriza alguma paranoia sobre valores familiares e opressão sexual, temas próprios da época. Geri mora com a mãe conservadora e a irmã, Alma Sanders (Fran Higgins), ambas órfãs de pai. No desenvolvimento da história com os básicos tópicos de descoberta, investigação e eliminação da ameaça, temos ainda a forte subtrama de Roger (R. A. Dow), homem que é arquétipo do cidadão interiorano, apaixonado por Geri e administrador dos negócios de seu pai numa fazenda que cultiva minhocas para comercialização. Ao lado dos bichos asquerosos, Roger vai ocupar uma posição de antagonismo considerável do meio para o final do filme.

Com imagens situadas numa região pantanosa da Georgia, o design de produção de Henry Shrady entrega uma construção convincente de espaços em A Noite do Terror Rastejante, filme que diverte e irrita ao mesmo tempo em seu design sonoro repleto de sons de porcos para representar a fúria das minhocas absurdamente perigosas. A trilha musical de Robert Prince também capricha nos acordes exagerados, acompanhamento para a direção de fotografia de Joseph Mangine, setor que emula as estratégias de POV de Tubarão para nos fazer adentrar no ponto de vista das minhocas se arrastando pelo chão, rumo aos seus alimentos humanos. Ademais, Rick Baker, mestre dos efeitos especiais que alguns anos depois, faria escola com Um Lobisomem Americano em Londres, assume a maquiagem das mortes e a massa expressiva das criaturas rastejantes e ariscas, insaciáveis em seu apetite por carne humana. Destaque para a cena de ataque na lanchonete e para a morte do xerife em pleno ato sexual. Ah, a vida ceifada da mãe de Geri e Alma, próximo ao final, pode representar a corrosão de determinados valores de uma época e o estabelecimento de uma nova ordem na cidade e na vida das garotas.

É preciso coragem para assumir que um filme do quilate de A Noite do Terror Rastejante pode sim, ter discussões intrigantes e subtexto com debates sobre temas mais sofisticados que seu argumento básico bizarro. Minhocas podem ser mortais? Sim, ao menos aqui. Na vida real, elas talvez causem nojo e sejam protagonistas de situações bizarras, tal como em 2013, época de horror para mais de 800 famílias de Okhlahoma, nos Estados Unidos, ameaçadas pela horda de minhocas que jorravam de suas torneiras e os impedia de utilizar água durante um longo período de tempo. Resistentes ao cloro e água sanitária, as criaturas minúsculas, originadas das larvas de moscas, trouxeram desconforto e pavor para as pessoas. Já pensou? Para assustar e causar desconforto ao longo dos 92 minutos do filme, os realizadores utilizaram uma espécie peculiar de minhocas, atrativas para pescaria por expelirem sangue e líquidos de coloração vermelha com aromas de fácil detecção na água. Na região da cabeça, estas criaturas possuem quatro tipos de antenas e uma parte do corpo consegue se projetar como se saísse de sua estrutura e se sobrepor para fora. Ao alcançar até 35 centímetros, elas não são nada elegantes e possuem um aspecto bem “escorregadio”, ideal para a proposta do filme.

A Noite do Terror Rastejante (Squirm, EUA – 1976)
Direção: Jeff Lieberman
Roteiro: Jeff Lieberman
Elenco: Don Scardino, Fran Higgins, Patricia Pearcy, R.A. Dow, Albert Smith (II), Angel Sande, Barbara Quinn (I), Carl Dagenhart
Duração: 93 minutos

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