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Crítica | Expresso do Amanhã – 2X02: Smolder to Life

por Ritter Fan
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  • Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios e do restante de nosso material sobre esse universo.

Eu até entenderia um narcisista com complexo de rei enlouquecendo vagarosamente ao longo de sete anos e tornando-se o déspota de um trem de serviço, quase sem comida, girando o mundo gelado eternamente e eu até acho que Sean Bean combina bem com esse papel. No entanto, não estou convencido de que, para que acreditemos em algo assim, torna-se necessário que Graeme Manson transforme o Sr. Wilford em um daqueles vilões que só falta esfregar as mãos, dar uma risada maníaca e enrolar seu bigodinho como basicamente acontece aqui em Smolder to Life.

Todo aquele ritual da banheira com o coitado do Kevin foi tão exagerado, tão fora de esquadro em sua tentativa de ser ousado e diferentão que o efeito é justamente o contrário, basicamente transformando Wilford em uma caricatura, em um daqueles vilões tão vilanescos que conseguem até mesmo fazer o mais histriônico dos vilões do 007 parecerem personagens bem construídos e desenvolvidos. Afinal, se o objetivo é mostrar um homem poderoso induzindo um homem fraco ao suicídio, há maneiras bem mais elegantes de se chegar ao mesmo resultado, vide Hannibal Lecter em O Silêncio dos Inocentes que faz isso off camera, mas com efeitos práticos para o espectador (e para Clarice, claro) absolutamente devastadores, de fazer o queixo cair. Aqui, apesar da temática pesada que exigiu até um aviso antes de o episódio começar, ficou só ridículo mesmo.

E o Sr. Wilford não precisava disso, isso é que é pior. Sua postura “o estado sou eu” já havia ficado clara em The Time of Two Engines e o ator já mostrou que sabe viver um personagem na fronteira da loucura com seu Boromir em A Sociedade do Anel. Além disso, há que destacar que toda a sequência da reunião/jantar a que Wilford e sua entourage são convidados por Layton já era o quase que literal tapete vermelho para que o personagem desfilasse sua demagogia de político com grande destaque e, novamente, abrindo espaço para Sean Bean fazer o que saber fazer melhor, com a direção de Christoph Schrewe espertamente tirando todo o proveito possível disso. Eu tenho diversos outros problemas com essa ocasião em si e que tratarei abaixo, mas nenhum deles tem relação com o espaço para Wilford mostrar sua sutil loucura.

A questão do tal jantar é, mais uma vez, a forma atabalhoada como todas as ações de Layton surgem e são implementadas. O personagem é o campeão em decisões que até podem ter algum mérito, mas que ele não sabe executar, recusando-se a ouvir as pessoas ao seu redor. Mas, pior do que isso, é a forma como o roteiro de Aubrey Nealon nos empurra goela abaixo os aspectos científicos que levam Melanie, Ben e Javi a concluírem que pode ser que a Terra esteja em processo de cura. Para começar, tudo é corrido, com aquele balão meteorológico funcionando tão maravilhosamente bem que me deixou pensando o porquê de isso não ter sido feito antes, talvez uma vez por ano só para ver se a situação é tão terrível quanto eles imaginavam ou algo do gênero. Depois, torna-se um tanto inverossímil que Alex, tendo examinado a amostra que Melanie colheu e tendo potencialmente a passado pelo crivo da dupla de cientistas de Big Alice, não tenha conseguido chegar à mesma conclusão. Tudo bem que foi interessante ver a causa específica na era do gelo da série ser abordada pela primeira vez fora da abertura animada do primeiro episódio da primeira temporada, mas esse elemento positivo poderia ter sido trabalhado com mais calma e mais lógica de forma que o tal jantar, se tivesse mesmo que acontecer, acontecesse talvez no próximo episódio ou no seguinte.

Os dois outros assuntos que são tratados paralelamente mostram um pouco mais do completo descontrole de Layton sobre basicamente qualquer coisa no Snowpiercer. A horrível mutilação de Lights (Miranda Edwards) serve como catalisador para Bess ser empossada como “detetive do trem” em um daqueles momentos que caem de paraquedas, mas que não precisava cair, já que, mais uma vez, havia espaço para tudo ser construído de maneira mais orgânica, até porque o caso em si, como um recado dado por simpatizantes a Wilford dentro do trem, tem um potencial conspiratório interessante. Mas a coisa não para por aí e Zarah descobre que ninguém menos do que Josie ainda está viva. Outro detalhe que passou batido por Layton e uma reviravolta que me pareceu extremamente forçada, mas que explica a preocupação gigantesca dos dois episódios em comemorar os avanços tecnológicos dos cientistas de Big Alice com pele artificial, pois, claro, muito em breve Josie será “reconstruída”.

Apesar de eu ter gostado que a reação inicial de Zarah tenha sido matar Josie para manter seu confortável status quo absolutamente intocado, a mudança de ideia e a revelação a Layton que sua amada está viva foi uma escolha bem mais confortável e comportada e isso em um mesmo episódio em que um homem induz outro a cortar os pulsos. Espero que haja uma boa história a ser contada com o retorno de Josie que vá além de eventual triângulo amoroso ou o recrudescimento da raiva por Melanie que, apesar de toda a sua crueldade “por um bem maior”, parece ser o único ser pensante nos dois trens somados.

Expresso do Amanhã precisa fazer duas coisas agora: (1) segurar as rédeas das bizarrices do Sr. Wilford de forma a permitir que Sean Bean faça do personagem o déspota louco que ele tem todo o potencial de ser sem a necessidade de se recorrer a bizarrices na banheira e (2) convocar uma equipe de roteiristas novos, com ideias frescas, somente para retrabalhar o personagem de Daveed Diggs, pois, a continuar desse jeito, será mais proveitoso arremessá-lo para fora do trem só de roupa de baixo. Se Manson fizer isso, a série sem dúvida alguma entrará nos eixos novamente.

Expresso do Amanhã – 2X02: A Coisa Está Ficando Quente (Snowpiercer – 2X02: Smolder to Life, EUA – 1º de fevereiro de 2021)
Showrunner: Graeme Manson (baseado no filme homônimo de Bong Joon-Ho e na graphic novel O Perfuraneve de  Jacques Lob, Benjamin Legrand e Jean-Marc Rochette)
Direção: Christoph Schrewe
Roteiro: Aubrey Nealon
Elenco: Jennifer Connelly, Daveed Diggs, Mickey Sumner, Alison Wright, Lena Hall, Iddo Goldberg, Susan Park, Sam Otto, Sheila Vand, Roberto Urbina, Mike O’Malley, Annalise Basso, Jaylin Fletcher, Steven Ogg, Rowan Blanchard, Sean Bean, Tom Lipinski, Damian Young, Sakina Jaffrey, Chelsea Harris, Andre Tricoteux, Miranda Edwards
Duração: 48 min.

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