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Crítica | Game of Thrones – 8X06: The Iron Throne

por Gabriel Carvalho
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As chamas se apagam. Depois de Daenerys Targaryen (Emilia Clarke) ter transformado Porto Real em muitos destroços e cinzas, o incêndio que preencheu o excelente The Bells adormece, tornando-se uma outra coisa. Um pesar proveniente da queda de uma Rainha que poderia ter sido a Rainha torna-se inexorável e marcaria, supostamente, uma conclusão amarga. Pois ainda que fossem cinzas preenchendo a cinematografia caprichada do terço inicial do capítulo e não mais fogo em si, o sentimento de derrota permanecia imperando, principalmente em Jon Snow (Kit Harington). O último capítulo de Game of Thrones absorve essa questão em seus primeiros minutos, explorando especialmente a dor que Tyrion (Peter Dinklage) carrega. Tais cenas iniciais capturam perfeitamente o teor fúnebre e desesperador do que seria a conclusão fúnebre e desesperadora da série mais acompanhada em anos. Mas o encerramento de Game of Thrones também desmancha esse calor para se esfriar mais objetivamente, não apenas apaziguando o sofrimento de milhares de pessoas, como também abrandando o futuro dos – agora – Seis Reinos.

Esse desmanche de tantas possibilidades trágicas a um seriado conhecido pela sua amargura acontece imediatamente após o grande acontecimento de The Iron Throne, que é a morte de Daenerys pelas mãos de Jon Snow. Previamente a isso, nesse começo superior ao restante do episódio, continua-se explorando competentemente as tensões construídas anteriormente em The Bells. No caso, a desordem que Jon sente em relação ao que é o certo a ser feito mostra ser, antes de qualquer coisa, o mote que constrói esse encerramento. E a direção impulsiona tal tensão por meio de caminhadas calmas, embora agoniantes, e trilha-sonora atmosférica. A prisão de Tyrion, após ter traído Dany, é uma decisão inteligente do roteiro, para se ter uma ameaça mais próxima em vista a Jon, precisando tomar uma decisão mais impulsiva. Esse é um personagem conhecido pela sua moralidade incorruptível, que não quebra suas promessas e que não quebra seus juramentos. Kit Harigton até segura a carga que o seu papel pede, interpretando um personagem que passa a enxergar a sua própria natureza como um impasse. Já o roteiro acerta ao reiterar isso.

A condução de David Benioff e D. B. Weiss, criadores da série e diretores do episódio, também interessantemente sugere, nesse início, o uso dos Imaculados e dos Dothrakis, as tropas de Daenerys, como sendo uma ameaça para Jon – o que seria completamente esquecido em outro momento. Há, contudo, um ar de perigo norteando Iron Throne em seu terço primeiro, com Snow sendo totalmente impotente frente a injustiças. A cena que envolve Verme Cinzento (Jacob Anderson) matando soldados desistentes pontua isso. Em seguida, um dos enquadramentos mais chamativos do episódio, por exemplo, contempla a Quebradora de Correntes como sendo um dragão propriamente dito. Noutro, Drogon surge de um mar de cinzas, como se estivesse camuflado. Consequentemente, somos aproximados ao evento clímax de um episódio que continua mais uma hora se prolongando. Porém, a ótima sequência da morte de Daenerys ganha um peso a mais com a participação de Drogon, assumindo um papel mais intimista enquanto encara Jon. Os efeitos visuais nos transportam à tristeza do personagem. Vai da tua fúria a tua dor.

O dragão então se vai e, com ele, também se vai o estudo dramático construído na temporada. É muito marcante a pressa com que os roteiristas quiseram resolver a série. Torna-se, portanto, quase natural o último episódio de Game of Thrones trajar os efeitos colaterais dessa escolha consigo. Há um grau de gravidade mais expressivo que nunca, visto que um viés conclusivo é urgente e não podemos esperar por mais oportunidades de desenvolvimento. A montagem do episódio, assim sendo, tem seus problemas, resolvendo-se de maneira episódica demais. Os últimos minutos do episódio inclusive esticam uma suavização para a conclusão, nos retomando aos protagonistas calmamente, como se os próximos passos fossem gloriosos. Existe a glória e só, sem cicatrizes, sem dor. Quando o capítulo passa do encerramento do núcleo de Daenerys e se encaminha para a resolução propriamente dita, que tem um tom mais esperançoso, existe uma passagem temporal esquisita. É como se fosse um capítulo completamente diferente. De começo, mina-se a ameaça dos Imaculados e dos Dothrakis de Daenerys, que tornam-se meros obstáculos.

Os espectadores são até enganados, porque partem do gigantesco clímax antecessor, a morte de Dany, para a caminhada de Tyrion aos Lordes de Westeros, já reunidos no seu julgamento. Esta parece ser uma consequência, mas não é. Um contexto completamente destoante daquele que era estabelecido numa construção, antes, pautada na derrocada, portanto, surge, primeiramente necessitando de uma gama de exposição para entendermos o que estaria em jogo em diante. Um excelente roteiro, por sinal, não foi o ponto mais positivo das derradeiras temporadas de Game of Thrones. Um problema de lógica e localização espaço-temporal apareceu inúmeras vezes ao longo dos anos. Aqui, a questão é introduzida com o teletransporte, ainda no começo, do Verme Cinzento para perto de Daenerys, chegando antes de Jon, apesar do personagem ter ficado para trás executando soldados. Ao mesmo passo, a conclusão que permite Bran Stark (Isaac Hempstead) ser proclamado Rei dos Seis Reinos – o Norte torna-se independente – também não consegue funcionar.  Tyrion torna-se Mão, enquanto o Verme Cinzento simplesmente observa essa conversa.

Mas o episódio torna-se, em contrapartida a algo mais sisudo, uma celebração de Jon ter feito a decisão correta e pronto, movendo-se por uma superficialidade. Usa-se certos escapes que não fazem jus à série. E o capítulo, piorando, nem ao menos se sucede em continuar questionando se o que o novo Targaryen fez foi certo ou não, apesar de pontuar essa problemática brevemente. Na última conversa de Jon com Tyrion, o personagem aponta diretamente ao anão que a sua sensação é negativa. Isso, no entanto, não é pensado pela direção em momento algum em termos de tom. Iron Throne procura concluir tudo com um ar de celebração e muita nostalgia, que é bastante cafona na verdade. Caso o teor dessa segunda parte do capítulo fosse mais depressivo, quiçá enxergando a ida de Jon Snow para a Patrulha da Noite como uma verdadeira infelicidade e não um suspiro de esperança, Iron Throne manteria uma coesão, pincelando às vezes resoluções mais suaves. Até retornar com a ameaça ao Norte, criando um encerramento cíclico, com a ida de Jon para além da Muralha sendo combinada com um possível retorno dos Outros seria uma opção.

Tudo para de queimar. Entretanto, Game of Thrones assume uma postura bastante confortável, ao invés de manter acesa a chama. O que permanece de mais coerente, que seria a reformulação no Trono de Ferro – derretido belissimamente por Drogon -, é minimizado. O discurso sobre a importância do passado, quando visto com outros núcleos, nesse segundo ato do encerramento, é visto de um modo mais passivo, sem muita sinceridade. Quando o seriado pensa piadinhas mais “complexas”, logo coloca uma sugestão à democracia como conhecemos ou retorna à mesma ideia metalinguística de O Hobbit. Esse apreço da série pela História, pela sua própria narrativa, é um apreço que não pensa tanto no impacto do passado no presente. Há ainda alguma coisa reverberando, contudo, nada muito provocante, que repense uma última vez trajetórias. Enquanto Brienne (Gwendoline Christie) escreve a história de seu amado, não pensa em escrever a sua própria. Esse propósito da História é uma desculpa para o episódio justificar a auto-referenciação que o permeia, sendo a mais sem-vergonha a em que Tyrion cita os seus tantos erros do passado.

Game of Thrones encerra-se, sendo assim, de uma maneira mais doce que provocante, que ácida, que realmente corajosa. As jornadas não tem as suas resoluções conversando agressivamente com o que acontecera. Claro que as coisas não deram certo, a Rainha destinada a ser a Rainha queimou uma cidade e milhões de vidas foram perdidas injustamente. Contudo, o que existe mais do que qualquer outra coisa no episódio é uma beleza estendida e contrastando, quebrando até, o impacto do que tinha acontecido previamente. Daenerys não é mais uma protagonista perdida, mas torna-se uma antagonista que foi vencida e agora tudo está bem nos Seis Reinos, governado por um rei justo – e pessimamente interpretado, por sinal. David Benioff e D. B. Weiss, por fim, estendem por minutos longos uma intercalação entre a conclusão das jornadas de Sansa (Sophie Turner), Arya (Maisie Williams) e Jon. E a roda transforma-se em algo completamente novo, mas como se esse algo completamente novo estivesse prestes a originar a paz sem mais problemas. Quando Jon atravessa a Muralha, vai desbravar o mundo e Arya também. Os perigos, quem sabe?

Game of Thrones – 8X06: The Iron Throne  (Idem, EUA – 19 de maio de 2019)
Showrunners: David Benioff, D.B. Weiss
Direção: David Benioff, D. B. Weiss
Roteiro: David Benioff, D. B. Weiss
Elenco: Peter Dinklage, Nikolaj Coster-Waldau, Lena Headey, Emilia Clarke, Kit Harington, Sophie Turner, Maisie Williams, Liam Cunningham, Alfie Allen, Nathalie Emmanuel, Gwendoline Christie, John Bradley, Isaac Hempstead, Rory McCann, Conleth Hill, Carice van Houten, Kristofer Hivju, Hannah Murray, Jerome Flynn, Joe Dempsie, Iain Glen, Pilou Asbæk, Richard Dormer, Ben Crompton, Hafþór Júlíus Björnsson, Jacob Anderson, Daniel Portman, Anton Lesser, Tobias Menzies, Bella Ramsey, Staz Nair, Lino Facioli, Rupert Vansittart, Gemma Whelan, Vladimir Furdik, Marc Rissmann
Duração: 79 min.

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