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Crítica | Mortal Kombat – Aniquilação

por Iann Jeliel
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A duologia de filmes dos anos 90 de Mortal Kombat certamente não foi pensada muito além do “vamos fazer dinheiro em cima do sucesso do jogo”. Uma prerrogativa inerente a um contexto em que nem o próprio videogame ainda se enxergava afirmativamente como um movimento artístico. É só perceber que as histórias dos games da franquia lançados até então eram mais pretextos, desculpas para fazer aqueles personagens exóticos batalharem em um duelo mortal de sanguinolência escapista. Portanto, se a mitologia interessante do universo de Mortal Kombat ainda viria a ser lapidada no futuro, naturalmente seus filmes estavam fadados a seguir a mesma bagunça desordenada de enredos, também utilizados somente como ponte para o entretenimento de assistir a sequências de pancadaria, só não tão violentas. Tanto o filme de Paul W.S Anderson quanto esta continuação denominada Mortal Kombat: Aniquilação têm em comum a limitação da necessidade de serem um produto amplo a todos os públicos, mesmo que os jogos dissessem o contrário.

Mortal Kombat se diferenciou e alcançou o seu principal concorrente Street Fighter por apostar na violência gráfica, exagerada e adulta, sendo inclusive um pontapé para expandir a comunidade gamer para outras idades, mas no cinema, especialmente considerando que o concorrente já havia lançado o seu filme, não daria pra fazer o mesmo, assim a violência teve de ser censurada para que o nome do filme fosse para além da limitação natural de idade, dado o grafismo do jogo – algo que não faz o menor sentido prático porque o jovem que viu o filme ficaria interessado em ir atrás de jogar e se depararia com a violência de qualquer forma. Sem essa violência e com claras limitações orçamentárias, o projeto enquanto blockbuster visando o entretenimento já nascia incompleto na própria proposta de reprodução momentânea a caracterizações, frases ou sonoridades icônicas da franquia nos videogames.

O primeiro filme até soube com alguma dificuldade converter a censura ao levar a fantasia característica de MK num corpo de Highlander ou outros medievais vulgares parecidos dos anos oitenta, valorizando a concepção prática dos cenários, figurinos e coreografias. Em Aniquilação, até existem esses efeitos práticos reaproveitados, figurinos também bem-caracterizados e coreografias igualmente para lá de encenadas a fim de parecerem os combos do jogo, contudo, diante de uma narrativa que propõe uma expansão de universo, a dependência do digital claramente o fez envelhecer muito mal, mesmo que a ideia de execução seja parecida com o primeiro, que acho minimamente divertido. A premissa de ter um torneio antes ajudava o sequenciamento das diferentes lutas a ter uma linha coerente. Aqui, não existe essa mesma base, tornando o passeio pelo reino da Terra invadida uma aleatoriedade de encontros sem qualquer peso até em crescente de escala.

Fora que são mal dirigidas. John R. Leonetti consegue a proeza de filmar ação pior do que W.S Anderson, que até conseguia em alguns momentos deixar a câmera estabilizada para a apreciação das coreografias, enquanto Leonetti balança o eixo de acordo com cada movimento dos personagens a todo momento, ou seja, a cada cambalhota o plano inclina junto, em cada soco o plano acompanha junto, e a separação de cortes entre esses momentos, geralmente filmados em primeiro ou primeiríssimo plano, não possui qualquer critério estético de junção. É não só confuso como exaustivo – além de feio, a cena da batalha na lama é constrangedora –, principalmente por não possuir mínimos elementos a torná-las diferenciadas umas das outras, como por exemplo, o uso de características particulares de combate de cada personagem. Quando tem, são demonstradas por meio de defeitos especiais, que nem mesmo olhando como brega involuntário deixa de ser incômodo. Não dá para acreditar nessa fantasia com telas verdes tão escancaradas, e mesmo se as ignorarmos, não há um fio condutor na história, ou um mínimo ponto de carisma para comprarmos a jornada.

Liu Kang (Robin Shou, que ao lado de Talisa Soto/Kitana foi o único remanescente do elenco do primeiro) é novamente o protagonista e junto de Raiden (James Remar) é o máximo que o filme consegue entregar como arco linear de personagem, embora seus tempos de tela sejam tão avulsos quanto os de quaisquer outros personagens, que estão ali somente para preencher o quadrado de todos os avatares originais do jogo. Existia no primeiro uma divisão elaborada de função de cada um na trama, mesmo que trabalhada em arquétipos básicos de estrutura narrativa. Aqui, parecem terciários dentro da história, o que torna muito mais difícil de comprá-la, mesmo num tato de total descompromisso e suspensão de descrença do público apreciador do “tosco” – vibe eu, trasheiro por natureza. O grande problema, reforço, não foi a falta de fidedignidade ou premissa adaptativa – há poucas derrapadas disso no filme, as que existem são bem grandes como o “Annimality” no final, mas não chega a ser algo tão absurdo quanto outras por aí –, mas a falta de alguém entendido que soubesse valorizar, vender e executar melhor essa transferência da franquia por diferentes mídias.

Se esses filmes já tiveram impacto em ambas as culturas, dos games e do que seriam suas adaptações no cinema – mesmo que essa com um legado bem ruim – sem serem tão boas no recorte da época, imaginem se tivessem sido feitos por alguém mais capacitado que R. Leonetti e W.S Anderson – que daqui pra frente só fariam bombas ainda maiores – para fazer um produto? E digo só como produto mesmo, já era suficiente para estabelecer um legado melhor no futuro das adaptações de games – mais autêntico. Ao menos a aposta direcionada ao público infantil, e pouca ou pior concorrência vinda depois, garantiu uma vida nostálgica útil à duologia, mesmo sem esta, especialmente Mortal Kombat: Aniquilação, merecer.

Mortal Kombat: A Aniquilação (Mortal Kombat: Annihilation | EUA, 1997)
Direção: John R. Leonetti
Roteiro: Lawrence Kasanoff, Joshua Wexler, John Tobias, Brent V. Friedman, Bryce Zabel
Elenco: Robin Shou, Talisa Soto, James Remar, Sandra Hess, Lynn ‘Red’ Williams, Brian Thompson, Reiner Schöne, Musetta Vander, Irina Pantaeva, Deron McBee, Marjean Holden, Litefoot, Chris Conrad, John Medlen, J.J. Perry, Tyrone C. Wiggins, Dennis Keiffer, Ridley Tsui, Keith Cooke, Dana Hee, Ray Park
Duração: 95 minutos

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