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Crítica | O Clube das Terças-feiras, A Casa do Ídolo de Astarte, Os Lingotes de Ouro e O Hadoque, de Agatha Christie

Fofocas criminosas.

por Luiz Santiago
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Lançado em junho de 1932, Os Treze Problemas é uma coletânea de contos de Agatha Christie que segue mais ou menos o caráter de “romance episódico” adotado em Sócios no Crime (1929), com os detetives Tommy e Tuppence. O livro ficou bastante conhecido por ser a primeira vez que encontramos uma das personagens mais queridas da autora, a velhinha detetive de St. Mary Mead: Miss Marple.

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O Clube das Terças-feiras

The Tuesday Night Club

  • Publicado originalmente na The Royal Magazine, em 1927. Nos Estados Unidos, o título foi alterado para The Solving Six. Sua primeira publicação em livro foi na coleção As Melhores Histórias de Detetive do Ano de 1928, pela Faber e Faber.

Nesta abertura despreocupada do livro, acompanhamos a formação do clubinho de fofoqueiros e fofoqueiras metidos a detetive que intitulam esta coletânea de assassinatos misteriosos. Um grupo de amigos que está conversando sobre diversos assuntos na casa de Miss Marple, em St. Mary Mead, e resolve colocar luz sobre crimes nunca resolvidos (nesse aspecto, me fez lembrar algumas histórias de O Misterioso Mr. Quin). O clube é formado por indivíduos diferentes em ocupação e personalidade, como se vê: Miss Marple; Raymond West, sobrinho da anfitriã, que é o escritor; a artista Joyce Lemprière; Sir Henry Clithering (antigo comissário da Scotland Yard); Dr. Pender (um religioso) e Sr. Petherick, que é advogado. Como não poderia deixar de ser, o assunto principal da roda acaba sendo direcionado para busca de pistas e hipóteses de resolução… e é então que a verdadeira alma do conto aparece. Quem inicia a “brincadeira” é Sir Heny, narrando a história de um trio que se sentou para jantar e depois todos adoeceram — supostamente de intoxicação alimentar –, mas um deles morreu. É uma história que tem um processo de questionamento muito bom, especialmente pelas condições dos envolvidos no tal jantar. A “investigação”, com a opinião do clube, é divertida, e as variantes para o possível envenenamento são ótimas. O problema é que à medida que a trama se aproxima do final, vai perdendo a graça, terminando com uma boa, mas indiferente solução.

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A Casa do Ídolo de Astarte

The Idol House of Astarte

  • Publicado originalmente na Royal Magazine, em 1928, no Reino Unido, e na Detective Story Magazine nos Estados Unidos. Lá, o conto teve o título The Solving Six and the Evil Hour.

Pensando na temporalidade de ações para o clube, os eventos deste conto se passam uma semana depois de O Clube das Terças-feiras, e quem narra o caso desta vez é o Dr. Pender. Esta é uma trama diferente no escopo da obra de Agatha Christie, pelos ingredientes sobrenaturais que pontuam o seu desenvolvimento (como ela faria, anos mais tarde, em O Cavalo Amarelo), mas a solução, como já era esperado, não apela em nada para o mundo espiritual. A trama acontece em Silent Grove, uma casa nos arredores de Dartmoor. A maneira como a autora descreve a atmosfera do local, a beleza de uma mulher chamada Diana (que está presente numa festa dada na casa, após a qual acontece a tragédia), as relíquias da Idade da Pedra na campina ao redor da propriedade e um “autêntico bosque de Astarte” nas redondezas ajuda ao leitor a construir um panorama muito sombrio e místico de todo o ambiente. É um conto que traz um crime incomum, com uma motivação que se coloca de forma diferente do que esperamos e uma resolução que faz jus ao suspense criado. Com certeza é uma das melhores histórias do volume.

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Os Lingotes de Ouro

Ingots of Gold

  • Publicado originalmente em Royal Magazine do Reino Unido em 1928, e nos Estados Unidos no mesmo ano, com o título The Solving Six and the Golden Grave.

Aqui é a vez do sobrinho de Miss Marple contar a história da vez. Apesar de estarmos diante de uma trama que é muito boa no todo, temos a sensação de que ela não passa de uma “simples história de pirata“. Ou quase isso. O interessante é que a narração que Raymond replica o relato de um amigo, falando sobre uns lingotes de ouro que aparentemente afundaram na costa da Cornualha. A hostilidade que temos no bar de marinheiros que Raymond detalha em sua narrativa me lembrou muito os cenários litorâneos explorados por Georges Simenon, especialmente em Inferno a Bordo. O enredo aqui é mais distanciado que os outros, e este talvez seja o conto que mais se pareça com “ficção“, no sentido interno de como as aventuras foram construídas pela autora na coletânea. Aqui eu também gosto mais do desenvolvimento do que da reta final e da resolução. O interessante é que eu não perdi, em nenhum momento, a ideia de “simples história de piratas” — embora esta não seja, mesmo, uma história de piratas; ela apenas carrega uma ideia, uma atmosfera ou cenário disso.

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O Hadoque

The Thumb Mark of St. Peter

  • Publicado originalmente na Royal Magazine no Reino Unido em 1928.

Narrada pela própria Miss Marple, essa história tem todos os ingredientes maravilhosos que encontramos nas tramas em que a velhinha detetive brilha, e desta vez, há algo bem particular em jogo, pois é a própria sobrinha dela, Mabel, que está em apuros e precisa de ajuda. Este é mais um suposto caso de “envenenamento”, que coloca em cena o falecido e odioso esposo de Mabel e, de certo modo, o local onde a família vivia. O leitor sente a estranheza da cidade julgando a jovem viúva, achando que foi ela que cometeu o crime. Nos bastidores, Mabel apresenta um comportamento depressivo e de alguém que tem crises de ansiedade e pânico, algo que a autora retrata e contextualiza muito bem. O Hadoque é uma história com uma virada inesperada e muito interessante em seu desfecho, indo na contramão de alguns contos do volume. Nesse caso, a história começa a ficar realmente boa do meio para o final, sendo o seu início um tantinho menos marcante e memorável. Esta foi uma das muitas vezes em que a autora me pegou totalmente de surpresa com a revelação e a motivação do assassino.

Os Treze Problemas (The Thirteen Problems) — Reino Unido, junho de 1932
Autora: Agatha Christie
Edição original: William Collins & Sons (Collins Crime Club)
Edição lida para esta crítica: Harper Collins Brasil, 2022
Tradução: Petê Rissatti
Capa da edição lida para esta crítica: Túlio Cerquize
258 páginas

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