Em sua campanha de divulgação, Os Anfitriões, Slasher Tardio lançado em 1987, inspirou-se no conceito de American Ghotic, famosa pintura de Grant Wood, uma imagem que expõe para o público um visão nada idealizada de uma família, algo bem distante da perspectiva “romantizada” impressa no imaginário cultural por Norman Rockwell ao longo de várias décadas do século XX. O filme é sábio ao trazer para a cena, a reversão de valores impostos por aqueles que pregam os ditos bons costumes, mas que na verdade são os mais doentios e equivocados da sociedade, numa trama que dialoga com a temática das famílias disfuncionais, vistos anteriormente em Psicose, adaptação do romance de Robert Bloch, pela assinatura de Alfred Hitchcock, e Quadrilha de Sádicos, um épico do horror manejado pelo mestre Wes Craven. Aqui, no entanto, estes filmes são trazidos para comparação, tendo a retranca “salvaguardadas as devidas proporções”, pois Os Anfitriões é um slasher tomado por problemas de ritmo, bem como carência no melhor desenvolvimento de suas situações que envolvem tensão.
Ao longo de seus 89 minutos, acompanhamos a trajetória de Cynthia (Sarah Torgov), uma mulher traumatiza por um acontecimento de seu passado recente, situação apresentada por meio de flashbacks explicativos. Ela perdeu o seu bebê depois que se dispersou com afazeres domésticos e deixou a criança rapidamente na banheira durante o asseio. Transtornada pelos acontecimentos, a personagem teve que passar por um período de internação numa clínica psiquiátrica, tendo em vista a recuperação diante de um choque tão intenso. Diante da necessidade de diversão, ela segue com um grupo de amigos numa viagem de avião. O problema é que no percurso, o motor da aeronave apresenta defeito e eles precisam realizar um pouso emergencial numa ilha que desconhecem. Assim, Jeff (Mark Erickson), Rob (Mark Lindsay), Lyn (Fiona Hutchson), Paul (Stephen Shellen) e Terri (Caroline Barclay), juntamente com a protagonista, precisarão arranjar um lugar para abrigo até as coisas se resolverem.
A sensação de lugar distante e com traços que nos lembram das narrativas góticas fica evidenciado pela direção de fotografa de Harvey Harrison, assertiva ao captar os pontos mais emblemáticos do espaço aberto, bem como a contemplação da casa onde os personagens decidirão utilizar como rápido aconchego. A trilha sonora de Alan Parker também funciona em prol da criação desta atmosfera de mistério, dando ao filme uma textura autêntica de narrativa de horror. Mas, afinal, o que há de tão terrível nesta região remota? Lá, caro leitor, os personagens enfrentarão os seus maiores pesadelos diante de uma família disfuncional, composta por figuras que cometem atrocidades em nome da moral e dos bons costumes, tomados pelo conservadorismo nosso de cada dia. Numa crítica social aos processos que engendram as hipocrisias de uma sociedade nega o direito de liberdade do outro, guiado pelo sufocamento de seus ideais deturpados, Os Anfitriões assume os ditames da cartilha slasher e promove a matança, num ritmo um tanto arrastado, mas ainda assim, satisfatório.
Na ilha, o grupo encontra a casa de Ma (Yvonne De Carlo) e Pa (Rod Steiger), patriarcas de uma família que tem como direcionamento, rígidos códigos morais, em especial, não fumar, não fazer sexo antes do casamento ou por diversão, tampouco a permissão de palavrões e posturas que envolvam roupas curtas ou exóticas demais. Eles são os pais de Fanny (Janet Wright) e Wood (Michael J. Pollard), duas figuras adultas, mas que se vestem e se comportam como crianças, sem tanta inocência assim, afinal, são arautos da morte, tal como os seus pais. Numa história que ainda envolve um bebê mumificado, alucinações e outras bizarrices, o filme dirigido por John Hugh, cineasta que se baseia no roteiro de Michael Vines e Burt Wetanson, funciona como um autêntico slasher, situado numa região distante, com antagonistas perigosos e dominadores do território, vantagens que deixam a situação de perigo ainda mais exponencial, pecaminosa apenas por demorar demais para que as coisas comecem a acontecer. Em linhas gerais, um slasher médio, com destaque para o ótimo trabalho de David Hiscox na composição dos cenários, um elemento importante para o estabelecimento da atmosfera de Os Anfitriões.
Os Anfitriões (American Ghotic, EUA – 1988)
Direção: John Hough
Roteiro: Burt Wetanson, Michael Vines
Elenco: Mark Erickson, Sarah Torgov, Michael J. Pollard, William Hootkins, Janet Wright, Yvonne De Carlo, Rod Steiger
Duração: 89 min.